Pular para o conteúdo principal

Estreias

Assim que o sino bateu mostrando que a primeira aula havia terminado, todos se levantaram e começaram a sair da sala. Lembro que eu achei aquilo muito estranho. Ainda haveria mais duas aulas antes do intervalo e não havia razão para que todos saíssem da sala, ainda mais com o consentimento da professora - Rosana se bem me lembro.

Sai sem entender, falaram que era porque ia ter jogo do Brasil. Na hora que eu saí da sala me deparei com o estacionamento do colégio lotado, cheio de pais esperando seus filhos em carros decorados de verde e amarelo. Minha mãe estava lá me esperando - isso era estranho, ela nunca ia me pegar no colégio - com duas fitinhas verdes e amarelas amarradas na antena do carro.

Na época eu senti uma sensação recorrente na minha vida. A sensação de que todo mundo sabia de uma coisa, menos eu. Como ninguém me avisou que íamos ser liberados? Eu estava no escuro quanto ao assunto. Hoje também penso que não fazia sentido todos termos ido ao colégio apenas para assistir uma aula e depois ir embora. O jogo era por volta das 14h30, entrávamos no colégio 13h, era melhor ter dispensado todo mundo logo.

Ali, no ano de 1994 aprendi que em dia de jogo do Brasil na Copa, ninguém trabalha. Depois aprendi que algumas pessoas trabalham sim e, que elas deviam ser bem infelizes.

O jogo naquela tarde era a estreia do Brasil na copa dos Estados Unidos, contra a seleção da Rússia. Oras, eu bem sabia que ia ter Copa, mas não tinha muita noção sobre os horários das coisas. O que eu lembro do jogo? Que o Brasil ganhou por 2x0, Romário fez um gol. O jogo parece que foi bem tranquilo, mas eu estaria mentindo se falasse de alguma coisa.

Em 1998 não. Naquele ano o Brasil seria pentacampeão do mundo e ia estrear contra a Escócia. O jogo era no começo da tarde e eu me preparei para ver aquilo. A vitória era uma certeza e, de certa forma, o gol do Cafu no final do jogo (na verdade, foi gol contra) foi apenas para confirmar essa certeza.

Na Copa de 2002, o jogo de abertura foi entre França e Senegal, bem de manhãzinha. A França era favorita, mas acabou perdendo do Senegal. Já o Brasil estreou uns dias depois, numa partida contra a Turquia. Estávamos numa situação terrível e a expectativa era a pior das possíveis. O jogo foi na alta madrugada - aliás, aquela Copa foi terrível para o sono normal. Os turcos saíram na frente, parecia que seria uma tragédia, mas o Brasil virou. O segundo gol foi roubado, mas enfim, são coisas do futebol.

A Copa da Alemanha, em 2006, foi a minha primeira Copa fora do colégio. Estava na faculdade e o primeiro jogo foi entre Alemanha e Costa Rica. Jogo no começo da tarde, foi uma chuva de gols - uma raridade no mundo das copas. O Brasil estreou alguns dias depois. Tínhamos um quadrado mágico e a obrigação de dar espetáculo. O jogo contra a Croácia foi duro, um gol solitário de Kaká e o prenúncio do fracasso daquele ano.

Na última Copa, em 2010, eu estava desempregado e resolvi assistir todos os jogos. Aliás, assisti todos e escrevi sobre todos neste blog. Estava com mais expectativa pelo futebol do que pela seleção. Dessa forma, o jogo inicial entre África do Sul e México me chamou mais a atenção do que a estreia  do Brasil. O gol de Tshabalala foi um dos grandes momentos daquela Copa. Não que a seleção brasileira fosse ruim, mas Dunga, tinha tanto ódio pela vida, que era impossível sentir empatia por ele.

Agora, 2014. A posição quanto ao futebol nunca foi tão política. Mas o que eu digo, é que eu gosto mais de futebol do que da seleção brasileira. Por isso, essa é a estreia do Brasil que aguardo com mais ansiedade desde 1998, pelo menos. Que comece a Copa e comecemos a mudar o Brasil em outubro.

Comentários

Postagens mais visitadas

Desgosto gratuito

É provável que se demore um tempo para começar a gostar de alguém. Você pode até simpatizar pela pessoa, ter uma boa impressão de uma primeira conversa, admirar alguns aspectos de sua personalidade, mas gostar, gostar mesmo é outra história. Vão se alguns meses, talvez anos, uma vida inteira para se estabelecer uma relação que permita dizer que você gosta de uma pessoa. (E aqui não falo de gostar no sentido de querer se casar ou ter relações sexuais com outro indivíduo). O ódio, por outro lado, é gratuito e instantâneo. Você pode simplesmente bater o olho em uma pessoa e não ir com a cara dela, ser místico e dizer que a energia não bateu, ou que o anjo não bateu, ou que alguma coisa abstrata não bateu. Geralmente o desgosto é recíproco e, se parar para pensar, poucas coisas podem ser mais bonitas do que isso: duas pessoas que se odeiam sem nenhum motivo claro e aparente, sem levar nenhum dinheiro por isso, sem nenhuma razão e tampouco alguma consequência. Ninguém vai se matar, brigar n...

Os 27 singles do Oasis: do pior até o melhor

Oasis é uma banda que sempre foi conhecida por lançar grandes b-sides, escondendo músicas que muitas vezes eram melhores do que outras que entraram nos discos. Tanto que uma coletânea deles, The Masterplan, é quase unanimemente considerada o 3º melhor disco deles. Faço aqui então um ranking dos 27 singles lançados pelo Oasis, desde o pior até o melhor. Uma avaliação estritamente pessoal, mas com alguns pequenos critérios: 1) São contados apenas o lançamentos britânicos, então Don't Go Away - lançado apenas no Japão, e os singles australianos não estão na lista. As músicas levadas em consideração são justamente as que estão nos lançamentos do Reino Unido. 2) Tanto a A-Side, quanto as b-sides tem o mesmo peso. Então, uma grande faixa de trabalho acompanhada por músicas irrelevantes pode aparecer atrás de um single mediano, mas com lados B muitos bons. 3) Versões demo lançadas em edições especiais, principalmente a partir de 2002, não entram em contra. A versão White Label de Columbia...

Tentando entender

Talvez a esquerda tenha que entender que o mundo mudou. A lógica da luta coletiva por melhorias, na qual os partidos de esquerda brasileiros se fundaram na reabertura democrática, não existe mais. Não há mais sindicatos fortes lutando por melhorias coletivas nas condições de trabalho. Greves são vistas como transtornos. E a sociedade, enfim, é muito mais individual. É uma característica forte dos jovens. Jovens que não fazem sexo e preferem o prazer solitário, para não ter indisposição com a vontade dos outros. Porque seria diferente na política? O mundo pautado na comunicação virtual é um mundo de experiências individuais compartilhadas, de pessoas que querem resolver seus problemas. É a lógica por trás do empreendedorismo precário, desde quem tem um pequeno comércio em um bairro periférico, passando por quem vende comida na rua, ou por quem trabalha para um aplicativo. Não são pessoas que necessariamente querem tomar uma decisão coletiva, mas que precisam que seus problemas individua...