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Mostrando postagens de 2023

Reflexões Pós-Paul

Acho que sei bem o momento em que tudo ficou claro. Foi durante Something. Uma música que nem é do Paul, mas a qual ele defende com unhas e dentes durante sua homenagem ao amigo George Harrison. Empunhando seu pequeno instrumento, Paul McCartney pediu para todos cantarem por George. Aproveitando a ausência dos outros instrumentos, a voz e o ukulele de Paul ecoavam pelo Maracanã. As pessoas já cantavam junto, em um momento bem bonito. Até que veio o refrão, que todo mundo ali conhecia. E aquele I Don't Know veio subindo pelas arquibancadas do antigo maior do mundo, criando um daqueles ecos que provocam um sentido de comunhão sagrada. Sim, ali foi possível entender. Paul McCartney está, talvez, em sua passagem mais unânime pelo Brasil. Sempre houve expectativa em suas outras apresentações, não há registro de uma única viva alma que tenha se arrependido de assistir o Beatle ao vivo. Só que agora ele está velho. Muito velho. Um senhor de 81 anos de idade, que apesar do vigor, já dá sin

Reflexões pré-McCartney

 Talvez eu pudesse ter assistido um show do Paul McCartney antes. De 2010 para cá o ex-Beatle veio um par de vezes ao Brasil e se apresentou nas grandes capitais como Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte, Salvador, Fortaleza e Recife. Tocou até em locais fora do grande eixo de shows, como Florianópolis, Goiânia e Cariacica. Sim, no Espírito Santo. Algumas vezes faltou vontade, um pouco mais de esforço. Em outras sobraram algumas desculpas pessoais, apesar de que, como é que não se pensou em ir até Brasília ver um show? Na última vez estávamos grávidos e aí não tinha como. Em um dos shows dele, acho até que estávamos em São Paulo, mas esperando para ir de férias para outro lugar. Ele chegou a estar no Brasil enquanto eu estava na Europa. Foram tantos shows que chegou a parecer banal e trivial. Qualquer dia viria essa oportunidade. Eu nem gostava tanto do Paul, essa chatice existencial que muitas vezes tenta diminuir os fatos bons por qualquer impli

Tópicos sobre a Seleção do Diniz

 - Tite ainda é o melhor treinador brasileiro em atividade. O salto de produtividade que a seleção deu sob o seu comando é notável. Quando ele assumiu o time nas Eliminatórias para 2018, a situação da equipe era parecida com a atual. Com o agravante de que eram duas vagas a menos. - O trabalho de Tite foi bom, apesar de que possa ser dividido em dois momentos: foi muito bom até o título da Copa América de 2019, razoável depois disso. A equipe que arrancou para vitórias consecutivas em 2018 teve grandes atuações, momentos de espetáculo, com Neymar e Philippe Coutinho em grande fase. Uma defesa forte, meio campo articulado, ataque móvel. Após o título da Copa América de 2019, o time foi ficando mais previsível e monótono. - Dizem que Tite ficou obcecado após enfrentar uma linha de 5 da Inglaterra em um amistoso de 2018. O que o levou a uma busca insana pelo tal jogo posicional. Acho este um marco da seleção rumo a monotonia. - A grande crítica ao time do Tite é a falta de habilidade para

Genética

Eu estava no Ensino Médio quando formulei uma teoria que basicamente dizia "genética é uma merda". Entre aulas que mostrava cruzamentos de fenótipos, genes recessivos, X e x e análises sobre a probabilidade de alguém ter olho azul, eu cheguei a essa conclusão. Algo pensado há muitos anos e que basicamente significa que você vai herdar tudo quanto é coisa ruim que for possível. Acho que comecei a pensar nisso quando eu descobri que tinha colesterol alto aos 10 anos. "Igual ao pai" falaram. Meus triglicerídeos sempre estiveram em níveis alarmantes, mesmo nos momentos mais saudáveis da minha vida. Depois vieram a pressão alta, também paterna. Os óculos de grau. É preciso ficar atendo ao câncer de próstata e ao câncer de pele, de origem paterna, assim como a diabetes. Sem contar que seus dois avôs tiveram derrames. E o refluxo, igual ao da família da mãe. Veja, ninguém nunca surge por aí ostentando a visão perfeita que veio da mãe. Ou um sistema cardiovascular impecável

Os discos que The Doors lançou sem Jim Morrison

Imagine, um disco do The Doors sem o Jim Morrison. Que sacrilégio, que blasfêmia. Eis algo difícil de raciocinar, afinal, o Jim Morrison era o Doors. Tudo bem que boa parte da graça das músicas estava no teclado hipnótico do Manzarek, mas a banda era o Morrison. Um cara bonito, com presença de palco, carismático, chamativo, que cantava bem, era polêmico, autodestrutivo e tinha uma veia poética. Sem ele The Doors não seria nada. É como um museu sem sua obra principal, ou uma dessas comparações feitas pela Adriana Calcanhoto. Mas essa blasfêmia é real, como não. Três meses após a morte de Jim Morrison, os três membros restantes colocaram na praça Other Voices , disco que é bem verdade, começou a ser gravado ainda antes de um Morrison bêbado, gordo, barbudo e deprimido ter uma overdose de heroína na banheira do apartamento onde vivia no Marais, em Paris. Other Voices parece um disco de demos, com algumas bases boas mas que parecem não ter sido desenvolvidas o suficiente. A própria banda

Tudo se aposta

 No mundo das apostas esportivas é possível apostar em vencedores, perdedores, empatadores, em placares, em número de faltas, em número de escanteios, em número de laterais, em cartões, em expulsões, em defesas, em gols sofridos. É possível combinar mais de uma estatística para faturar números ainda maiores. É possível apostar pequenas quantidade, assim como grandes quantidades. É um mundo à margem da lei, no qual é possível inclusive manipular a realidade para obter vantagens. É isso que mostra a investigação iniciada no Ministério Público de Goiás sobre aliciamento de atletas por apostadores. Quase todo grande escândalo esportivo envolve apostas. No futebol brasileiro nós tivemos o caso da máfia das loterias nos anos 80, depois o escândalo do juiz Edilson em 2005. Só que, esses casos, envolviam placares de jogos, arranjos mais complexos. Hoje em dia, quanto tudo se aposta, a manipulação é quase inevitável. Faz tempo que a gente escuta notícias de manipulação de resultados em jogo de

Faixa de pedestres

Em plena Avenida dos Trabalhadores um jovem trabalhador negro se aproxima da faixa de pedestres segurando a sua bicicleta. Ainda não eram 7h30 da manhã e o trânsito começava a ficar pesado na semana em que muitas férias se encerravam. Um carro para, ele avança pela faixa da esquerda. Na faixa central uma caminhonete diminuí a velocidade e o trabalhador segue sua travessia. Era impossível não notar sua caminhada para o outro lado da rua. No entanto, a caminhonete apenas diminuía a velocidade para passar por cima da faixa, sobe a faixa no momento em que o ciclista pedestre entra no mesmo espaço, aquele espaço que dois corpos não podem ocupar ao mesmo tempo. O motorista da picape atinge a roda dianteira do ciclista que com o impacto se desequilibra e quase caí no chão. Revoltado ele gesticula contra o motorista, que pede desculpas constrangidas. Sem maiores danos físicos, exceto o susto da quase tragédia, o ciclista segue para a calçada e o motorista segue seu caminho. Eis um momento que

Pelé - Arte e Força

O futebol sempre foi um embate entre arte e força. Esquadrões artísticos, como a Hungria de 54 ou o Brasil de quase desde sempre se debatiam contra os panzers alemães, ou os carrascos uruguaios. Mas além das disputas coletivas, há a questão individual. No futebol, há quem seja o touro e quem seja o toureiro. Garrincha, Maradona, Messi, Tostão, Bergkamp, Zidane, Rivaldo e outros encarnam a figura do toureiro. São a arte. Jogadores que transformam o espaço de um guardanapo em um latifúndio. Dribles milimétricos ou elásticos, transformam o adversário em parte do espetáculo, em coadjuvantes da magia. Parte da graça está justamente na forma como deixam o adversário para trás na forma de uma ilusão de ótica, aplicam passes improváveis e espaços aparentemente inexistentes. O combate individual faz parte do espetáculo. Do outro lado, Mbappé, Cristiano Ronaldo, Ronaldo, Kaká e outros são os touros. Arrancam em velocidade e deixam os adversários anônimos para trás, caídos no chão, desolados dian