Tomaz tem nove anos e virou um símbolo nacional involuntário. Terça-feira no momento em que a Alemanha marcou seu quarto gol sobre o Brasil no Mineirão, a transmissão da FIFA focou suas câmeras no garoto, que espremia os olhos debaixo das lentes dos óculos, a cara enfiada num desses copos comemorativos que ficaram famosos nessa Copa do Mundo. Depois, foi possível perceber que Tomaz já chorava após o terceiro gol alemão, deu uma esticada de pescoço e o quarto gol saiu, junto com suas lágrimas.
A Copa de 1998 foi especial para mim. Tinha 11 anos e nessa época da vida, nada podia ser mais importante do que o futebol. Além disso, era a Copa na qual o Brasil conquistaria o pentacampeonato. Com 11 anos você não se importa muito com questões táticas, merecimento, o que acontece fora do gramado. Você quer ver seu time vencendo de qualquer jeito e a Copa de 1998 foi recheada de emoções. Os jogos contra a Dinamarca e Holanda foram desesperadores, mas a França não parecia uma ameaça real. O Zidane não jogava nada.
A final foi disputada num dia 12 de julho, um domingo como outro qualquer e eu fui lá assistir o jogo, com a minha camisa do Brasil. Sempre me lembro quando na hora do almoço o meu tio apareceu dizendo que o Edmundo estava escalado no lugar do Ronaldo e isso criou aquele clima de apreensão geral. Na hora do jogo o Ronaldo estava lá e tudo parecia como sempre, vamos dizer.
Claro que, analisando o jogo hoje, foi um verdadeiro massacre francês. O Brasil não viu a cor da bola e os 3x0 do placar final foram modestos, conquistados graças a ruindade de Guivarch e Dugarry, os péssimos centroavantes franceses.
Mas, repito, eu tinha 11 anos e nessa época não há uma visão racional sobre o futebol. Os gols franceses me pareceram frutos do acaso, corremos alguns riscos, mas no futebol é assim. O segundo tempo me pareceu uma pressão enorme do Brasil e o gol só não saiu porque o destino era cruel. Segui com o coração na mão até algum momento ali perto dos 45 do segundo tempo, quando alguma bola bateu na trave ou algo assim. Desisti e sai da sala segurando as lágrimas e só escutei uma tia avó lamentando "coitado".
Sentei no jardim e chorei. Não vi o terceiro gol francês e acho que só soube que o jogo terminou 3x0 no dia seguinte. Em algum momento minha mãe veio me consolar, escutou meus lamentos sobre o quanto aquilo era injusto e enfim. A vida seguiu mais triste.
Imagino a frustração do garoto Tomaz. Acho até vergonhoso ver marmanjos chorando por um jogo de futebol, mas entendo as crianças. Tomaz não tem culpa da seleção ter feito uma copa horrível e nunca ter jogado bem. Não tem culpa do fato de o futebol brasileiro ser comandado por cartolas incompetentes e pelo Felipão não ter o menor preparo para armar uma equipe taticamente. Ele só queria ver a sua seleção ganhar, estava presente em um momento de sonho, uma semifinal de Copa do Mundo na cidade dele. E esse sonho se transformou num pesadelo terrível com os gols em sequência da Alemanha. Quando a gente é criança, realmente acredita que pode estar vivendo um sonho ou um pesadelo e que a qualquer momento você vai acordar para uma nova realidade.
Mas não é assim. O futebol também ensina que a vida é isso que ela é. O Tomaz nunca vai se esquecer desse jogo, assim como eu nunca me esqueci daquela final de 1998. Mas a vida segue. Você é impotente diante de várias situações, ela não acontece como você quer. O futebol te ensina, ainda criança, a conviver com as porradas que a vida dá e só resta continuar.
Comentários