Pular para o conteúdo principal

Um olho na grande estrela

A notícia do ataque cardíaco que causou a morte de Alex Chilton, principal compositor do Big Star, não irá aparecer em grandes jornais e nem ganhará destaque nos sites da internet. O seu coração parado não terá a mesma relevância do coração parado de Michael Jackson.

De certa forma essa era a sina do Big Star. A maior banda do rock, jamais descoberta. Lançaram apenas três discos, colecionaram fracassos, decepções, brigas e no fim se transformaram em apenas um mito underground.

As origens do Big Star são de Memphis, mesma cidade de Elvis Presley. Mas essa é a única semelhança. O primeiro disco da banda, #1 Record (1972), é uma das maiores estréias da música pop. E ninguém ouviu. A banda conseguiu boas audições nas rádios, mas a gravadora não foi capaz de montar uma estratégia de distribuição dos discos. Resultado: algumas pessoas até queriam comprar o álbum, mas não conseguia achar.

Os poucos sortudos que conseguiram, tiveram o privilégio de escutar lindas baladas como Thirteen e The Ballad of El Goodo. Também puderam apreciar a voz ácida de Chris Bell em Feel e My Life is Right. Era um disco cheio de possíveis hits, mas nenhum se tornou realidade.

O fracasso comercial aumentou a pressão sobre a banda. Dizem que Chris Bell saiu na mão com o baixista Andy Hummel e que chegou a quebrar o carro do produtor. Com a situação incontrolável, Bell deixou a banda durante as gravações do segundo disco, Radio City (1974).

Disco esse que foi bem recebido pela crítica (a Rolling Stone considera este o melhor disco da banda). O disco tem a mesma fórmula do anterior, mas em minha opinião é o menos inspirado da banda. E um novo fracasso comercial veio. Dizem que o disco vendeu menos de 10 mil unidades.

Foi a vez então de Andy Hummel deixar o baixo e ir cuidar da sua vida. Resolveu terminar a faculdade e ter uma vida normal, uma vez que a banda não dava futuro.

Sozinhos, Chilton e o baterista Jody Stephens resolveram gravar o terceiro disco ainda no mesmo ano. O resultado final agradou, mas nenhuma gravadora quis lançar o material, por considerá-lo muito depressivo. Só quatro anos depois ele foi lançado e sua versão definitiva apareceu apenas em 1992, época na qual a banda passou a ser conhecida, graças a admiração de outras bandas como R.E.M., Replacements, Teenage Fanclub e Wilco.

O terceiro disco ganhou dois nomes Third/Sister Lovers. E é genial. É absolutamente heartbreaking, como diria a lista da NME. As músicas são carregadas de uma fragilidade emocional intensa. Holocaust é fúnebre, Big Black Car letárgica, Thank You Friends desolada. Não há sinal de esperança no disco.

E não havia mais esperança para a banda que acabou em 1974. Voltou apenas em 1993, para curtir a fama underground e fazer shows.

Com o fim da banda Hummel sumiu e Stephens virou baterista de estúdio. Alex Chilton tentou tocar com várias bandas, sem sucesso, até virar uma espécie de crooner.

Já Chris Bell teve um destino mais trágico. Saiu da banda deprimido, alcoólatra, viciado em heroína e mal-resolvido com sua sexualidade. Tentou uma carreira solo sem sucesso e se sustentou trabalhando no restaurante do pai. Morreu em um acidente de carro em 1978. E ele não estava bêbado, drogado, ou dirigindo em alta velocidade. Acredita-se que ele tenha apenas dormido, cansado após um dia de trabalho perto do ano novo. E ah, seu carro era simples.

Bell não pode então aproveitar o mínimo de reconhecimento que a banda conseguiu nos anos 90.

Em 1998 alguns dos artistas citados e mais Afghan Whigs, Matthew Sweet, Whiskeytown e outros gravaram um disco tributo a banda. Mas, para manter a sina da banda, a companhia que planejou o lançamento faliu. E o disco foi lançado apenas em 2006.

A sorte realmente não é para todos.

Menos mal para Alex Chilton, que ele ainda pode ver o lançamento de Keep an Eye on the Sky, Box espetacular que reúne canções da banda, versões alternativas, demos e mais um show ao vivo. Uma antologia sensacional e que faz justiça a história do conjunto.

Comentários

Postagens mais visitadas

Oasis e a Cápsula do Tempo

Não dá para entender o Oasis pensando apenas na relevância das suas músicas, nos discos vendidos, nos ingressos esgotados ou nas incontáveis exibições do videoclipe de Wonderwall na MTV. Além das influências musicais, das acusações de plágio e das brigas públicas, o Oasis faz parte de um fenômeno cultural (um pouco datado, claro), mas é uma banda que captou o espírito de uma época e transformou isso em arte, promovendo uma rara identificação com seus fãs. Os anos 1990 foram marcados por problemas econômicos no mundo inteiro. Uma juventude já desiludida não via muitas perspectivas de vida. A Guerra Fria havia acabado, uma nova revolução tecnológica começava, o Reino Unido vivia uma crise pós governo Thatcher e nesse cenário surge um grupo cantando letras incrivelmente ousadas para meros desconhecidos.  Definitely Maybe, primeiro disco do grupo, fala sobre curtir a vida de maneira meio sem propósito e sem juízo. A diversão que só vem com cigarros e álcool, o sentimento supersônico de...

Oasis de 1 a 7

Quando surgiu em 1994, o Oasis rapidamente se transformou em um fenômeno midiático. Tanto por suas canções radiofônicas, quanto pela personalidade dos irmãos Gallagher. Eles estiveram na linha frente do Britpop, movimento que redefiniu o orgulho britânico. As letras arrogantes, o espírito descolado, tudo contribuiu para o sucesso. A discografia da banda, no entanto, não chega a ser homogênea e passa a ser analisada logo abaixo, aproveitando o retorno do grupo aos palcos brasileiros após 16 anos.  Definitely Maybe (1994) O primeiro disco do Oasis foi durante muito tempo o álbum de estreia mais vendido da história do Reino Unido. Foi precedido por três singles, sendo que dois deles são clássicos absolutos - Supersonic e Live Forever . O vocalista Liam Gallagher cantava em algum lugar entre John Lennon e Ian Brown, enquanto o som da banda bebia de quase tudo o que o Reino Unido havia produzido nos 30 anos anteriores (Beatles, T. Rex, Sex Pistols, Smiths, Stone Roses). O disco começa c...

Somos todos Leicester

O que era inacreditável, o que parecia impossível agora é verdade. O Leicester é o campeão inglês da temporada 2015-16. Incrível que o título tenha vindo de maneira até confortável, com duas rodadas de antecedência. Incrível que mesmo com a folga na tabela e a liderança estável nas últimas rodadas, era impossível acreditar que o título realmente viria. Parecia que a qualquer momento os Foxes poderiam desabar. O que mais falar sobre esse time? Formado por uma série de refugos, jovens que jamais explodiram, uma ou outra promessa. Filho de goleiro, zagueiro jamaicano e zagueiro alemão grosso, atacante japonês, atacante que até outro dia jogava no futebol amador. Não há nada parecido com o que Leicester fez nesse ano na história do futebol. Talvez na história do esporte. O título do Leicester é uma das maiores façanhas da história da humanidade. Não há o que falar, o que teorizar. Só resta olhar esse momento histórico e aceitar que às vezes o impossível acontece. Que realmente nada é i...