Depois de décadas de domínio da música produzida na Bahia com Ivete Sangalo, Asa de Águia, Daniela Mercury, Chiclete com Banana e seus derivados, ocorreu um processo de descentralização do Hit do Carnaval, que já passou pelas mãos de Michel Teló e abraçou cada vez mais o sertanejo universitário e o funk.
Além de sair de sua terra natal - fruto talvez do crescimento do carnaval de rua em várias outras cidades do país? - a popular música festeira brasileira saiu da mão de seus hitmakers consagrados e passou a cair nos colos de One Hit Wonders, como Psirico (Lepo Lepo), Banda Vingadora (cujas metralhadoras desapareceram) e o saudoso MC G15, que talvez tenha morrido de tanta onda e nós nem ficamos sabendo. Artistas que acertam apenas um tiro certeiro e alcançam o estrelato nacional proporcionado por emplacar um Hit de Carnaval (matérias nos jornais, convites para festas e shows, dinheiro, superexposição midiática).
Parecia ser justamente o caso de Juju Toddynho que pareceu surgir do nada no momento certo com Que Tiro foi Esse para substituir a insossa Vai Malandra de Anitta e uma dezena de convidados. Mas, em um movimento ainda mais surpreendente da gosto popular, eis que surgiu MC Loma com Envolvimento para desbancar a artista mainstreem e a alternativa. MC Loma é uma alternativa da alternativa, a extrema alternativa e o sucesso de Envolvimento beira o inexplicável.
Se Toddynho ainda contou com alguma produção e divulgação seu hit hashtagiano, MC Loma gravou uma música imperativa em autotune e gravou um vídeo praticamente amador que subiu ao Facebook despretensiosamente. Fez tanto sucesso que ganhou um videoclipe produzido e dirigido pelo diretor-ostentação Kondzilla e as duas obras audiovisuais já somam 47 milhões de visualizações. (Anitta conseguiu 193 milhões com a divulgação mundial de Vai Malandra).
O grande mérito da pernambucana de 15 anos é que Envolvimento é um pequeno choque de realidade dentro da sociedade brasileira. Enquanto Vai Malandra é um retrato tipo exportação do Brasil, com sua favela cenográfica, bundas ostentação, danças estilo Beyonce teletransportadas para a Rocinha, cantores gringos falando sobre bundas e a velha ladainha das letras de Anitta (vou te seduzir, vamos ver onde essa porra vai chegar, duvido que você aguenta o meu fogo), Envolvimento é vida real.
A pobreza glamourizada tipo exportação da Anitta é contraposta por uma alegria genuína de quem não tem muita coisa na vida e talvez por isso tenha tudo. Um humor genuíno e espontâneo, o carisma puro da cantora e de suas primas dançarinas, sua dificuldade de dicção e mensagens difíceis de serem decifradas como tal "Cebruthius" - esta corruptela de Bluetooth, confusão tão besta quanto a sua inclusão repetitiva e sem sentido, mas cuja explicação sincera a torna extremamente simpática.
Provável que agora MC Loma perca sua autenticidade - essa é a palavra - e vire um personagem, uma cópia dela mesma, entre em uma espiral de repetição e fique para sempre perdida nesses dias mágicos do começo de fevereiro.
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