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Intervenção

Os números do anuário de segurança pública mostram que o Rio de Janeiro é o 10º Estado mais violento do Brasil. Os dados estatísticos mostram que o número de ocorrências policiais na capital Rio de Janeiro caíram um pouco em relação ao ano passado e despencaram em relação a dois anos atrás. Os números, portanto, mostram que não há nenhuma excepcionalidade na situação de violência do Rio de Janeiro. Isso mesmo com a superexposição das imagens de arrastões, roubos e ataques violentos contra as pessoas no carnaval, imagens que se somam a sensação de caos generalizado provocado pela crise econômica que arrasa o Estado. Não há nada científico que justifique uma intervenção militar por lá, pois o problema é o mesmo de sempre.

No entanto, a violência do Rio de Janeiro é mais assustadora pelo fato de que ela é visível. É visível por ser uma cidade enorme, cartão-postal brasileiro no exterior, e é visível porque a violência ocorre nas áreas ricas da cidade. Ao contrário de outras capitais brasileiras, em que os assassinatos e ações violentas se concentram nas franjas invisíveis da cidade, no RJ ela ocorre no meio das áreas ditas civilizadas.

Pode ser uma visão preconceituosa, ou uma análise mais fria, mas o fato é que ninguém - quando digo ninguém falo de uma certa consciência coletiva, incluindo a imprensa, se importa quando os pobres que moram longe estão morrendo ou sofrendo qualquer violência, lá longe, em um lugar em que ninguém consegue ver. A violência no centro da cidade, no entanto, é intolerável.

João Pessoa, a simpática capital paraibana é a 16ª cidade mais violenta do mundo e o turista que anda pela tranquilidade do Tambaú/Cabo Branco não consegue imaginar isso. Há uma sensação de tranquilidade e ordem ao se caminhar nessa zona turística, tal qual há tranquilidade para quem anda na praia de Ponta Negra em Natal, a 13ª cidade mais violenta do mundo. Ali, onde os turistas estão no seu dia-a-dia, em restaurantes caros, pode haver um ou outro assalto que assusta a população, mas não há nenhum cadáver.

No entanto, no caminho para o aeroporto é possível perceber onde estão todos esses assassinatos. Na periferia. Assustadora, sombria, sem nenhuma presença do Estado. Estão lá longe, longe dos olhos da mídia, dos cidadãos de bem e ordeiros. Ninguém se importa. Veja o caso de Brasília: há o pacífico plano piloto, enquanto que nas cidades satélites cinco pessoas são assassinadas por noite. Mas, quem se importa com Sobradinho?

Na capital fluminense, a periferia está no meio da cidade. A Rocinha está do lado de Ipanema e do Leblon. O morro do pavão desce em Copacabana. Os principais pontos turísticos da cidade estão rodeados pela favela. Então, tem arrastão na rica zona sul. Gente levando facada na Lagoa Rodrigues de Freitas. Não há zonas de segurança, de paz e ordem para o cidadão de bem. Está todo mundo sitiado. Se todos os assassinatos do RJ estivessem concentrados na baixada fluminense, ninguém se importaria. Seria uma zona violenta, que deve ser evitada, o crime estaria invisível.

***

Fora isso, há claro o fator de marketing. A violência e a segurança pública viraram as principais preocupações do cidadão de bem - até este termo horrível voltou à tona. Faltando oito meses para eleição e sem conseguir tornar palatável sua pauta antipopular, Michel Temer resolveu tomar uma ação populista e eleitoreira. Ao invés de tentar se emplacar como o "reformista", o vampirão resolveu se transformam no "Homem que combateu a violência". Pior é que isso realmente pode aumentar a popularidade do homem, porque o brasileiro está muito doido.

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