1) Precisamos falar sobre o Kelvin. O excluído do rolê que, enquanto ainda estávamos nos familiarizando com o skate nas Olimpíadas, acertou uma manobra sobre um corrimão que garantiu a primeira medalha brasileira em Tóquio.
2) Daniel Cargnin foi a Tóquio para brigar, mais do que para lutar. Sempre parecia estar em desvantagem nas suas lutas, mas de alguma forma ele conseguia se manter em pé e encaixar os golpes que garantiram a manutenção da tradição do judô brasileiro nas Olimpíadas.
3) Há cinco anos, Rayssa Leal era uma criança que viralizou na internet fazendo manobras impressionantes no skate vestida de fadinha. Cinco anos depois, ela continua sendo uma criança, só que com uma medalha olímpica. Com 13 anos, Rayssa magnetizou o público no início da madrugada e se transformou na nossa mais jovem medalhista da história. Nas entrevistas pós-façanha, sua voz não escondia. Ela é apenas uma criança.
4) Fernando Scheffer precisou treinar em um açude para manter a forma durante a pandemia. Estava fora do radar principal, mas desde o início mostrou que estava lá para fazer o seu melhor. Bateu o recorde sul-americano duas vezes, a segunda na final que garantiu a medalha. Em um país acostumado a ganhar medalhas com seus fenômenos das piscinas, o trunfo de Scheffer é o trunfo do nadador comum, que nunca foi o mais forte, o mais rápido, ou o mais resistente, como ele diz. Sempre foi o mais esforçado.
5) Em um mar digno dos filmes do Godzilla, Ítalo Ferreira se mostrou dominante desde o início. Fez o que faz desde que aprendeu a surfar em uma tampa de isopor. Passou por cima de jurados, tufões e uma prancha quebrada na final. Voltou à areia chorando, fez os repórteres chorarem e lamentou que sua vó não estava mais ali para ver aquele momento.
6) Mayra é sinônimo de judô, é sinônimo de luta. Maior medalhista individual feminina da história, o quimono é sua pele, o tatame é seu corpo. Mayra sempre entra para vencer e vence mesmo quando não ganha. Três vezes em que precisou superar a frustração da derrota para dar a volta por cima e garantir uma medalha. Não há o que possa parar essa mulher, patrimônio olímpico brasileiro.
7) A serenidade de Rebeca Andrade impressiona. Antes de executar suas acrobacias, seu olhar exala uma confiança rara no mundo da ginástica. Só ela sabe o que ela precisou para chegar até ali e as dificuldades do caminho significam que não são quatro aparelhos que irão derrubá-la.
8) Ninguém esperava nada de Laura Pigossi e Luisa Stefani. A revolução delas não foi televisionada. Enquanto derrubavam favoritas na quadra 5, podíamos apenas acompanhar os resultados. Cabeças de chave canadenses e americanas, tradicionais duplistas tchecas e russas. O caminho da glória, de alguma maneira, sempre esteve escrito. Incontáveis match points salvos são apenas uma prova disso. No final, o abraço emocionado foi uma das cenas mais bonitas do Brasil nas Olimpíadas.
9) Quanto tempo Bruno Fratus precisou esperar para realmente estar felizão. E talvez ninguém nunca esteve tão feliz quanto ele.
10) Porque toda história sempre pode ficar ainda melhor. Rebeca Andrade saltou para a estratosfera, retornou ao solo com delicadeza e depois disso nada mais foi como antes.
11) Alison dos Santos encara a vida com uma leveza incomum para alguém que carrega no rosto as marcas de um trauma de infância. Saltou obstáculos de 87cm de altura como se eles não existissem, ganhou medalha na prova de mais alto nível das olimpíadas e confessou que não via a hora de voltar para casa e jogar truco com o pai.
12) A família Grael de alguma maneira conhece os segredos do mar. São herdeiros de Poseidon e carregam no sangue os códigos que decifram os sentidos dos ventos e das marés. Martine Grael e Kahena Kunze são a dupla perfeita de um Brasil que pode não ser o Brasil real que nos emociona, mas é um Brasil que também existe, e que também é Brasil.
13) Abner Teixeira só queria construir uma casa para a mãe. Ganhou uma medalha e que nada o impeça de prosseguir com os seus sonhos.
14) Só diz que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar quem não conhece Thiago Braz. Dono de uma das maiores façanhas olímpicas da nossa história, retornou aos Jogos como outsider e novamente foi superando sarrafos para garantir uma medalha que jamais pareceu sua. Thiago Braz nasceu para saltar em Olimpíadas, e os anos que separam uma edição dos Jogos da outra são apenas uma interminável esperar para o seu momento de brilhar.
15) Ana Marcela Cunha já deveria estar lá há muito tempo, mas por alguma razão nunca deu certo. A baiana decidiu que essa era a sua hora, colocou seus braços a serviço da história, passou por cima de cardumes e foi a única brasileira com fôlego ao final das duas horas de maratona aquática.
16) Pedro Barros voou para transformar o Brasil no país do Skate. Ninguém entendeu sua entrevista, mas tudo bem, ele se comunica melhor com seu skate.
17) Não dá para descrever a audácia de um cidadão que nasce em uma pequena cidade no meio da Bahia e resolve ganhar uma prova que sempre foi dominada por europeus. Isaquias despejou toda sua potência na água, mudou a rotação do planeta com suas remadas e confirmou que é um colosso, um dos maiores brasileiros da história.
18) Hebert Conceição, o nobre guerreiro de alma leve que merece pra caralho, uma figura autêntica que superou as barreiras da probabilidade da sua modalidade para alcançar a glória com um cruzado de esquerda.
19) O time de futebol, que mostrou que difícil é vencer pela primeira vez.
20) Beatriz Ferreira, da Bahia com amor, da Bahia berço do Brasil e agora das glórias olímpicas.
21) As meninas do vôlei, que venceram na hora certa para garantir uma medalha que parecia reservada a outros países antes do início da disputa.
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Mas nem só das vitórias vivem as glórias. A eternidade há de estar reservada para Darlan Romani, Hugo Calderano, Érica de Sena e Maria Portela. Ela já está reservada para Bruninho, Lucarelli, Agatha, Bruno Schmidt e tantos outros. E por mais que não brilhem aos olhos do povo, as glórias de Marcus D'Almeida, Ygor Coelho e Kawan Pereira também devem ser reverenciadas.
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