Pular para o conteúdo principal

A glória do Big 4 é também o fracasso de uma geração

Comecei a escrever este texto logo depois das semifinais do Australian Open deste ano, quando Novak Djokovic e Rafael Nadal varreram os jovens Lucas Pouille e Stefano Tsitsipas da quadra e marcaram mais um encontro na final.

Cheguei a retomar o rascunho quando ficou claro que o título de Wimbledon não escaparia de Djokovic, Nadal ou Roger Federer. Depois ainda veio mais um US Open vencido por Nadal, para reforçar a tese.

O domínio que o chamado Big Four impôs ao tênis nos últimos 15 anos é algo incomparável na história do esporte. De 2004 para cá, foram disputados 64 torneios de Grand Slam. Roger Federer, Rafael Nadal, Novak Djokovic e Andy Murray conquistaram 57 deles, quase 90%.

(Andy Murray conquistou apenas três títulos, mas se (lembrando que SE não existe), seus sonhos mais confortantes se tornassem realidade e se Roger Federer tivesse virado pastor de ovelhas nos Alpes Suíços, Rafael Nadal fosse caixa da vidraçaria do pai e Novak Djokovic cumprisse a mesma função em uma pizzaria de Belgrado, Andy Murray teria hoje pelo menos 18 títulos de Grand Slam e seria tratado como o maior de todos os tempos.)

Gastón Gaudio, Marat Safin, Juan Martín del Potro, Stan Wawrinka (três vezes) e Marin Cilic foram os raros tenistas que conseguiram quebrar essa sequência, sendo que os dois primeiros o fizeram antes do surgimento de Rafael Nadal e são de uma geração anterior.

Del Potro, Wawrinka e Cilic fazem parte de uma geração do tênis que deve lamentar o ano em que nasceram. Assim como Tsonga, Berdych, Ferrer e alguns outros que poderiam ostentar estantes com quatro ou cinco troféus de Grand Slam se não convivessem com alguns extraterrestres que resolveram praticar tênis. Mas, o que esses nomes mostram, entre outras coisas, é o fracasso tenístico da geração que nasceu no começo dos anos 90.

Djokovic e Nadal fazem parte de um grupo raro de esportistas que foram talentos precoces e se transformaram em gênios da maturidade. O sérvio tinha 20 anos quando conquistou seu primeiro troféu e ganhou Wimbledon já aos 31. O espanhol tinha acabado de completar 19 anos quando conquistou Roland Garros pela primeira vez e chegou ao seu 12º troféu no saibro aos 33. (Federer não foi tão precoce assim, já tinha 22 anos no seu primeiro título e dominou as quadras até os 29. Depois ressurgiu aos 35, o que faz com que seu lado gênio da maturidade seja mais forte que o talento da precocidade).

O tênis sempre teve seus adolescentes vencedores. Bjorn Borg venceu seu primeiro Slam aos 18 anos, assim como Wilander e Boris Becker. Mas Willander parou de vencer aos 24. Borg se aposentou aos 27. Becker ganhou um título aos 29, depois de cinco anos sem vitórias. Já Lendl só começou a vencer aos 24, e bem, é muito difícil ser vencedor por tantos anos seguidos assim.

O fato é que voltando aos furões da era de domínio do Big 4, o mais novo deles é Marin Cilic, que nasceu cinco dias depois de Del Potro em setembro de 1988. Tinha 26 anos quando ganhou seu US Open. Ou seja, estamos chegando ao fim dos anos de 2010 e nenhum tenistas nascido a partir de 1989 ganhou um Grand Slam. Tal fato se repetiu nos Masters 1000 até que Zverev, nascido em 1997 ganhou um título.

O fato é que a geração de Nishikori e Raonic não chegou lá. Nem a de Dimitrov, nem a de Thiem e parece cada vez menos que isso vá acontecer. A peteca já está nas mãos de Khachanov, Medvedev (conseguiu o feito de endurecer uma final de Grand Slam contra Nadal), Coric e Zverev, de olho em Tsitispas, Shapovalov e De Minaur, além de outros adolescentes. Mas, ninguém ainda parece perto de derrotar o agora trio de ferro.

No Australian Open de 2017, quando Murray sucumbiu as lesões e Djokovic, também machucado e aparentemente com a cabeça fora de órbita caíram cedo, a janela para os oponentes pareceu ter se aberto. Mas, a final foi entre os renovados Federer e Nadal. Desde então, o trio FND conquistou todos os Grand Slams. E não é só isso: ocupam as duas primeiras posições do ranking da ATP 2004.

O curioso, é que a geração nascida nos anos 1990 também não tem conseguida sucesso em outros esportes.

Vamos ao mais famoso deles, o futebol. Os agora trintões Lionel Messi e Cristiano Ronaldo dominam as premiações individuais desde 2008. O único a romper esse domínio, no ano passado, foi Luka Modric nascido em... 1985. Mas não é só isso. Na década, apenas três jogadores nascidos no anos 1990 conseguiram ficar entre os três primeiros: Neymar, Griezmann e Salah.

Vamos a Fórmula 1 onde vemos o formidável talento de Max Verstappen, o mais jovem vencedor de todos os tempos, quando ainda tinha 18 anos. Pois ele é o único piloto nascido nos anos 1990 a ter vencido na Fórmula 1. Ninguém que nasceu entre 1990 e 1996 venceu corridas, sequer marcou uma pole.

Isso depois de termos vistos uma série de talentos precoces nos anos 2000 (Primeiro Alonso, depois Hamilton e por último Vettel, derrubaram o recorde de mais jovem campeão de todos os tempos).

Por mais que não seja tratado como um fracasso geracional, esportistas e mídia especializada de certa forma tentam entender as razões pelas quais há esse hiato. O Tênis, por exemplo, tem seu top 100 mais idoso da história.

Será que a geração pré-Chernobyl tem alguma grande vantagem esportiva? Ou será que a nova geração nascida em um mundo digital e repleto de informações, que essa nova geração enfrenta uma dificuldade maior de manter o foco em um mundo estimulante e cheio de distrações, não consegue manter o foco necessário que super-atletas conseguem?

(E aqui me lembro porque este texto está há oito meses rodando pelo meu rascunho. Não tenho a menor ideia de como terminá-lo, mas já desisti dessa missão).

Comentários

Postagens mais visitadas

Aonde quer que eu vá

De vez em quando me pego pensando nisso. Como todos sabem, Herbert Vianna, dos Paralamas do Sucesso, sofreu um acidente de avião em 2001. Acabou ficando paraplégico e sua mulher morreu. Existe uma música dos Paralamas, chamada "Aonde quer que eu vá" que é bem significativa. Alguns trechos da letra: "Olhos fechados / para te encontrar / não estou ao seu lado / mas posso sonhar". "Longe daqui / Longe de tudo / meus sonhos vão te buscar / Volta pra mim / vem pro meu mundo / eu sempre vou te esperar". A segunda parte, principalmente na parte "vem pro meu mundo" parece ter um significado claro. E realmente teria significado óbvio, se ela fosse feita depois do acidente. A descrição do acidente e de estar perdido no mar "olhos fechados para te encontrar". E depois a saudade. O grande detalhe é que ela foi feita e lançada em 1999. Dois anos antes do acidente. Uma letra que tem grande semelhança com fatos que aconteceriam depois. Assombroso.

Imola 94

Ayrton Senna era meu herói de infância. Uma constatação um tanto banal para um brasileiro nascido no final dos anos 80, todo mundo adorava o Senna, mas eu sentia que era um pouco a mais no meu caso. Eu via todas as corridas, sabia os resultados, o nome dos pilotos e das equipes. No começo de ano comprava revistas com guias para a temporada que iria começar, tinha um macacão e um carrinho de pedal com o qual dava voltas ao redor da casa após cada corrida. Para comemorar as vitórias do Senna ou para fazer justiça com meus pedais as suas derrotas. Acidentes eram parte da diversão de qualquer corrida. No meu mundo de seis anos, eles corriam sem maiores riscos. Pilotos por vezes davam batidas espetaculares, saiam ricocheteando por aí e depois ficava tudo bem. Já fazia 12 anos que ninguém morria em uma corrida. Oito sem ninguém morrer em qualquer tipo de acidente. Os últimos com mais gravidade tinham sido o do Streiff e do Martin Donelly, mas eu nem sabia disso, para dizer a verdade. Não sab

Ziraldo e viagem sentimental por Ilha Grande

Em janeiro de 1995 pela primeira vez eu saí de férias em família. Já havia viajado outras vezes, mas acho que nunca com esse conceito de férias, de viajar de férias. Há uma diferença entre entrar em um avião para ir passar uns dias na casa dos seus tios e pegar o carro e ir para uma praia. Dormir em um hotel. Foi a primeira vez que eu, conscientemente, dormi em um hotel. Contribui para isso o fato de que, com sete anos, eu havia acabado de terminar a primeira série, o ano em que de fato eu virei um estudante. Então, é provável que pela primeira vez eu entendesse o conceito de férias. Entramos em uma Parati cinza e saímos de Cuiabá eu, meus pais, minha prima e minha avó. Ao mesmo tempo em que essas eram as minhas primeiras férias, elas eram também a última viagem da minha avó. A essa altura ela já estava com um câncer no pâncreas e sem muitas perspectivas de longo prazo. Disso eu não sabia na época. Mas ela morreu cerca de um ano depois, no começo de 1996, após muitas passagens pelo hos