Pular para o conteúdo principal

Os cães gêmeos da rua sem nome

Há uma rua em Várzea Grande, cujo nome eu não faço a menor ideia, onde vivem dois cachorros gêmeos. Não é uma rua muito famosa e movimentada, mas ela está mais popular neste momento, por conta dos desvios provocados por obras. Para mim, essa rua sempre foi popular por conta dos dois cachorros idênticos.

Imagino que não existem cachorros gêmeos idênticos. Eles sempre nascem em ninhadas grandes, com cinco, seis irmãos, dez irmãos. Não sei quantos irmãos tem os gêmeos da rua sem nome, mas sei que os dois sempre estão lá. Brancos, com manchas continentais marrons pelo corpo, porte pequeno. De dentro do carro, parecem ter o mesmo tamanho.

De dentro do carro, os vejo deitados na porta de uma casa. Não sei se moram por lá. Quando chove, eles se refugiam em uma área coberta, quando está frio eles se enrolam perto da porta. Não imagino que eles tenham uma rotina muito agitada. Eles não são desses cachorros que correm atrás dos carros. Eles sempre estão parados na porta, exibindo sua semelhança.

Vez por outra, passo por essa rua e vejo que um dos dois não está lá. Fico preocupado, pensando no que é que aconteceu. A vida de um cachorro criado na rua pode não ser muito agitada, mas com certeza não é segura. São muitos carros, muitos acidentes que podem abreviar ainda mais a vida de um cachorro.

Geralmente, essa aflição passa logo, porque logo vejo um deles duas esquinas depois, perto de um bar, comendo algum resto de comida, ou demarcando território. Minha maior preocupação é que os dois sejam separados. Sozinhos, eles são cachorros normais, como tantos outros cães perdidos na rua. A graça deles está em sua união.

Mas, agora minha preocupação aumentou. Faz duas semanas que não vejo os cães gêmeos parados no seu ponto da rua sem nome. Para mim, os dois deveriam ser eternizados naquele lugar.

*artigo para o Centro Burnier.

Comentários

Postagens mais visitadas

Oasis e a Cápsula do Tempo

Não dá para entender o Oasis pensando apenas na relevância das suas músicas, nos discos vendidos, nos ingressos esgotados ou nas incontáveis exibições do videoclipe de Wonderwall na MTV. Além das influências musicais, das acusações de plágio e das brigas públicas, o Oasis faz parte de um fenômeno cultural (um pouco datado, claro), mas é uma banda que captou o espírito de uma época e transformou isso em arte, promovendo uma rara identificação com seus fãs. Os anos 1990 foram marcados por problemas econômicos no mundo inteiro. Uma juventude já desiludida não via muitas perspectivas de vida. A Guerra Fria havia acabado, uma nova revolução tecnológica começava, o Reino Unido vivia uma crise pós governo Thatcher e nesse cenário surge um grupo cantando letras incrivelmente ousadas para meros desconhecidos.  Definitely Maybe, primeiro disco do grupo, fala sobre curtir a vida de maneira meio sem propósito e sem juízo. A diversão que só vem com cigarros e álcool, o sentimento supersônico de...

Oasis de 1 a 7

Quando surgiu em 1994, o Oasis rapidamente se transformou em um fenômeno midiático. Tanto por suas canções radiofônicas, quanto pela personalidade dos irmãos Gallagher. Eles estiveram na linha frente do Britpop, movimento que redefiniu o orgulho britânico. As letras arrogantes, o espírito descolado, tudo contribuiu para o sucesso. A discografia da banda, no entanto, não chega a ser homogênea e passa a ser analisada logo abaixo, aproveitando o retorno do grupo aos palcos brasileiros após 16 anos.  Definitely Maybe (1994) O primeiro disco do Oasis foi durante muito tempo o álbum de estreia mais vendido da história do Reino Unido. Foi precedido por três singles, sendo que dois deles são clássicos absolutos - Supersonic e Live Forever . O vocalista Liam Gallagher cantava em algum lugar entre John Lennon e Ian Brown, enquanto o som da banda bebia de quase tudo o que o Reino Unido havia produzido nos 30 anos anteriores (Beatles, T. Rex, Sex Pistols, Smiths, Stone Roses). O disco começa c...

Somos todos Leicester

O que era inacreditável, o que parecia impossível agora é verdade. O Leicester é o campeão inglês da temporada 2015-16. Incrível que o título tenha vindo de maneira até confortável, com duas rodadas de antecedência. Incrível que mesmo com a folga na tabela e a liderança estável nas últimas rodadas, era impossível acreditar que o título realmente viria. Parecia que a qualquer momento os Foxes poderiam desabar. O que mais falar sobre esse time? Formado por uma série de refugos, jovens que jamais explodiram, uma ou outra promessa. Filho de goleiro, zagueiro jamaicano e zagueiro alemão grosso, atacante japonês, atacante que até outro dia jogava no futebol amador. Não há nada parecido com o que Leicester fez nesse ano na história do futebol. Talvez na história do esporte. O título do Leicester é uma das maiores façanhas da história da humanidade. Não há o que falar, o que teorizar. Só resta olhar esse momento histórico e aceitar que às vezes o impossível acontece. Que realmente nada é i...