Pular para o conteúdo principal

Cruyff

O ano, se eu não me engano, era 1999. A revista placar publicou uma série de edições especiais e uma delas continha a sempre pretensiosa e polêmica listagem: os 100 maiores jogadores de todos os tempos. Como era uma espécie de consenso naqueles tempos, Pelé aparecia em primeiro lugar e Maradona em segundo. A partir daí é que a polêmica sempre aumentava e o terceiro lugar era ocupado por Johan Cruyff.

Lembro de ter ficado fascinado com aquele holandês magrelo que na foto aparecia sentado sobre a bola, envergando a diferente, mas sempre bela camisa do Ajax. Magro, cabelos longos, parecia até um pouco desengonçado. Não parecia um atleta.

O texto colaborava com essa impressão. Cruyff era filho de uma faxineira do clube e passou a treinar futebol por incentivo da mãe, para ver se ele conseguia superar uma má-formação em seus pés. Johan também fumava de maneira alucinada, incluindo um cigarro no intervalo dos jogos. Mesmo assim era o terceiro maior jogador da história.

Poucos jogadores construíram, voluntariamente ou involuntariamente, uma mística ao seu redor. Personalidade forte, deixou de jogar uma Copa do Mundo na Argentina porque não concordava com o regime político do país. Não quis jogar com o Real Madrid, porque não jogaria em um time associado ao franquismo. Na Copa de 1974 jogou com um uniforme diferente dos seus companheiros, porque era patrocinado pela Puma e a seleção tinha camisas da Adidas.

Foi um dos jogadores mais técnicos da história. Parecia ter total controle do seu corpo para executar o que quisesse. Batia na bola das mais diversas formas. Fazia o difícil parecer ridiculamente fácil. Tricampeão europeu com o Ajax, campeão espanhol após 12 anos com o Barcelona.

Enquanto treinador foi tão bom quanto foi como jogador. Montou um Barcelona que ganhou a alcunha de Dream Team, tetracampeão espanhol e campeão europeu pela primeira vez. Influenciou Pep Guardiola e muito do melhor futebol que se vê hoje em dia.

Gênio tático. Símbolo do futebol total, do futebol bonito. Fã de Beatles. Ateus. Casado com a mesma mulher a vida inteira. Mais do que um jogador, um técnico, um pensador do futebol. Único.


Comentários

Postagens mais visitadas

Aonde quer que eu vá

De vez em quando me pego pensando nisso. Como todos sabem, Herbert Vianna, dos Paralamas do Sucesso, sofreu um acidente de avião em 2001. Acabou ficando paraplégico e sua mulher morreu. Existe uma música dos Paralamas, chamada "Aonde quer que eu vá" que é bem significativa. Alguns trechos da letra: "Olhos fechados / para te encontrar / não estou ao seu lado / mas posso sonhar". "Longe daqui / Longe de tudo / meus sonhos vão te buscar / Volta pra mim / vem pro meu mundo / eu sempre vou te esperar". A segunda parte, principalmente na parte "vem pro meu mundo" parece ter um significado claro. E realmente teria significado óbvio, se ela fosse feita depois do acidente. A descrição do acidente e de estar perdido no mar "olhos fechados para te encontrar". E depois a saudade. O grande detalhe é que ela foi feita e lançada em 1999. Dois anos antes do acidente. Uma letra que tem grande semelhança com fatos que aconteceriam depois. Assombroso.

Ziraldo e viagem sentimental por Ilha Grande

Em janeiro de 1995 pela primeira vez eu saí de férias em família. Já havia viajado outras vezes, mas acho que nunca com esse conceito de férias, de viajar de férias. Há uma diferença entre entrar em um avião para ir passar uns dias na casa dos seus tios e pegar o carro e ir para uma praia. Dormir em um hotel. Foi a primeira vez que eu, conscientemente, dormi em um hotel. Contribui para isso o fato de que, com sete anos, eu havia acabado de terminar a primeira série, o ano em que de fato eu virei um estudante. Então, é provável que pela primeira vez eu entendesse o conceito de férias. Entramos em uma Parati cinza e saímos de Cuiabá eu, meus pais, minha prima e minha avó. Ao mesmo tempo em que essas eram as minhas primeiras férias, elas eram também a última viagem da minha avó. A essa altura ela já estava com um câncer no pâncreas e sem muitas perspectivas de longo prazo. Disso eu não sabia na época. Mas ela morreu cerca de um ano depois, no começo de 1996, após muitas passagens pelo hos

Imola 94

Ayrton Senna era meu herói de infância. Uma constatação um tanto banal para um brasileiro nascido no final dos anos 80, todo mundo adorava o Senna, mas eu sentia que era um pouco a mais no meu caso. Eu via todas as corridas, sabia os resultados, o nome dos pilotos e das equipes. No começo de ano comprava revistas com guias para a temporada que iria começar, tinha um macacão e um carrinho de pedal com o qual dava voltas ao redor da casa após cada corrida. Para comemorar as vitórias do Senna ou para fazer justiça com meus pedais as suas derrotas. Acidentes eram parte da diversão de qualquer corrida. No meu mundo de seis anos, eles corriam sem maiores riscos. Pilotos por vezes davam batidas espetaculares, saiam ricocheteando por aí e depois ficava tudo bem. Já fazia 12 anos que ninguém morria em uma corrida. Oito sem ninguém morrer em qualquer tipo de acidente. Os últimos com mais gravidade tinham sido o do Streiff e do Martin Donelly, mas eu nem sabia disso, para dizer a verdade. Não sab