Você tem 14 anos e pela primeira vez na vida começa a ter alguns amigos. Gosta de alguma garota, mas prefere nem pensar nisso porque sabe que jamais seria correspondido e a dor da rejeição seria maior que qualquer coisa. E isso aqui não é um roteiro de filme besta, é a vida real, você não pode fazer nada. O ano está próximo do fim e você começa a sentir saudade das coisas que nunca viveu. O que te sobra? Escutar Oh! Darling e tentar expulsar todos os seus demônios internos juntos com os gritos de Paul McCartney.
Abbey Road sempre será um disco atual e em meados de 2001 era o único disco dos Beatles existente aqui em casa, sei lá porque motivos. Até hoje ele tem um selo na parte de trás, quase apagado, indicando que ele custou R$ 8,90. Inacreditável.
Vivia com os Beatles uma relação normal, como a de qualquer cara que sabe alguma coisa no mundo. Sabe que eles eram famosos, que John era o revoltado e Paul era o romântico e mais um monte de informações que você não tem certeza de quando é que entraram na sua vida. Vez por outra minha mãe colocava Abbey Road pra tocar e eu não dava bola. Mas, ali por 2001, a coisa ficou diferente. Acho que era culpa da adolescência e de todos esses demônios internos que atormentam qualquer cara de 14 anos. Adolescência nunca é uma época boa, só depende de quando você tem a percepção disso tudo. Pois, foi nessa época que comecei a entregar minha vida para a música.
Fora toda a história sentimental, não dá pra negar que Abbey Road é um disco sensacional. Há nele uma melancolia de fim de freira e quando assisti ao Anthology, fiquei com a impressão de que todos os envolvidos sabiam que aquilo ali era o fim e que eles queriam apenas que esse fim fosse digno. Há em tudo ali, inclusive na capa icônica, a certeza de que tudo isso ai ficar pra posteridade.
Come Together é a típica música que não se faz mais hoje em dia, sem exagero. Existe muita música boa feita desde 1969 e inclusive em 2013, mas quantas tem essa pegada? Há um quê messiânico em seu refrão, com uma linha de baixo forte e hipnotizante e a certeza de que sim, você irá junto, aonde quer que John Lennon vá. Something é a composição mais famosa de George Harriso e nem mesmo a superexposição é capaz de estragar a sua beleza.
Abbey Road não é um disco completamente convencional. Paul grita como nunca havia gritado em Oh! Darling, até o Ringo manda bem na sua composição e John pira em I Want You. Os medleys que compõe o lado B são belíssimos e o disco se encerra com The End. Qualquer banda daria sua vida para compor uma música com The End, com seus solos de guitarra e a harmonia final belíssima. Qualquer banda venderia a alma para encerrar sua carreira com uma canção como The End, menos os Beatles que preferiram colocar Her Majesty, escondida depois, só de piada.
Se fosse escolher o disco mais marcante da minha vida, não poderia negar que esse disco é Abbey Road. Não consigo imaginar como seria minha vida se eu não tivesse me dedicado a escutar esse disco 13 anos atrás.
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