Pular para o conteúdo principal

A razão de cada um

*Artigo meia boca pro site do Centro Burnier

Eu não entendi e tenho a impressão de que você também não entendeu. A imprensa, professores, políticos, todos estão gastando seus neurônios tentando desvendas os motivos que levam milhares de pessoas as ruas em diversas cidades brasileiras. Os jornalistas não sabem nem como chamar as manifestações. É contra o aumento da tarifa de ônibus? Contra os gastos para a Copa do Mundo? Qual é a importância dos 20 centavos? Todo mundo tenta entender.

Tenho para mim que essa manifestação é sim contra os 20 centavos, mas é também contra a qualidade do transporte público, contra a PEC 37, contra os gastos com estádios para a Copa do Mundo, contra a violência policial, a corrupção, contra a falta de saúde de qualidade, educação de qualidade, para que as pessoas não escutem música sem fone de ouvido no ônibus, para que o Hulk não seja mais titular da seleção brasileira. Sim, todas essas reivindicações estavam em cartazes nas ruas.

Diria que cada uma das 100 mil pessoas que tomaram as ruas do Rio de Janeiro e todas as outras que estiveram em São Paulo, Brasília, Porto Alegre, cada uma delas tinha seu motivo para reclamar. É uma grande união de descontentamento. Um amigo meu me lembrou de Stuart Hall e seu conceito de “Identidade cultural na pós-modernidade”, as identidades fragmentadas e a fantasia de uma identidade unificada.

Cada um tem a sua razão para estar lá. Há quem proteste porque quer uma vida melhor, há quem proteste porque quer um mundo melhor, tem quem está lá por conta da adrenalina, quem quer se sentir parte de algo maior, quem quer ganhar fama, quem se esconde atrás de uma multidão para provocar baderna, ou quer tirar fotos ótimas para postar no Instagram.

As redes sociais, aliás, são um fato marcante de todas essas manifestações, por confundir completamente os papeis de emissor e receptor das informações. Pelo Twitter é possível ver a opinião de quem está no meio da rua, de quem está na janela, de quem está no sofá. Você vê as fotos dos profissionais e as fotos dos celulares. O Youtube permite o compartilhamento de imagens que você não vê na TV. O Facebook virou uma bomba de informações e é até difícil assimilar tudo. Fica mais difícil criar uma versão oficial dos fatos, porque cada um entende o que quer.

No fim, fico com uma definição que eu vi no Twitter. Os motivos dessas manifestações são justamente as pessoas.

Comentários

Postagens mais visitadas

Aonde quer que eu vá

De vez em quando me pego pensando nisso. Como todos sabem, Herbert Vianna, dos Paralamas do Sucesso, sofreu um acidente de avião em 2001. Acabou ficando paraplégico e sua mulher morreu. Existe uma música dos Paralamas, chamada "Aonde quer que eu vá" que é bem significativa. Alguns trechos da letra: "Olhos fechados / para te encontrar / não estou ao seu lado / mas posso sonhar". "Longe daqui / Longe de tudo / meus sonhos vão te buscar / Volta pra mim / vem pro meu mundo / eu sempre vou te esperar". A segunda parte, principalmente na parte "vem pro meu mundo" parece ter um significado claro. E realmente teria significado óbvio, se ela fosse feita depois do acidente. A descrição do acidente e de estar perdido no mar "olhos fechados para te encontrar". E depois a saudade. O grande detalhe é que ela foi feita e lançada em 1999. Dois anos antes do acidente. Uma letra que tem grande semelhança com fatos que aconteceriam depois. Assombroso.

Ziraldo e viagem sentimental por Ilha Grande

Em janeiro de 1995 pela primeira vez eu saí de férias em família. Já havia viajado outras vezes, mas acho que nunca com esse conceito de férias, de viajar de férias. Há uma diferença entre entrar em um avião para ir passar uns dias na casa dos seus tios e pegar o carro e ir para uma praia. Dormir em um hotel. Foi a primeira vez que eu, conscientemente, dormi em um hotel. Contribui para isso o fato de que, com sete anos, eu havia acabado de terminar a primeira série, o ano em que de fato eu virei um estudante. Então, é provável que pela primeira vez eu entendesse o conceito de férias. Entramos em uma Parati cinza e saímos de Cuiabá eu, meus pais, minha prima e minha avó. Ao mesmo tempo em que essas eram as minhas primeiras férias, elas eram também a última viagem da minha avó. A essa altura ela já estava com um câncer no pâncreas e sem muitas perspectivas de longo prazo. Disso eu não sabia na época. Mas ela morreu cerca de um ano depois, no começo de 1996, após muitas passagens pelo hos

Pattie Boyd

Pattie Boyd O romance envolvendo George Harrison, Pattie Boyd e Eric Clapton é um dos mais conhecidos triângulos amorosos da história. Sempre achei o caso interessante. A princípio, a visão que nós temos é bem simplista. Pattie trocou o sensível George Harrison, aquele que lhe cantou a sentimental Something na cozinha, pelo intempestivo Eric, aquele que a mostrou a passional Layla na sala. E se há uma mulher irresistível neste mundo, esta mulher é Pattie Boyd. Só que o trio Boyd-Harrison-Clapton é apenas a parte mais famosa de uma série de relações amorosas e traições, que envolveram metade do rock britânico da época. E o que eu acho incrível, é que todos continuaram convivendo ao longo dos anos. George Harrison Pattie Boyd era uma modelo que fazia figuração em um vagão de trem durante a gravação de uma cena de A Hard Day’s Night, o primeiro filme dos Beatles. George era justamente um Beatle. Eric Clapton era o deus da guitarra e converteu vários fãs em suas inúmeras bandas