Foi em uma quinta-feira ensolarada que eu o vi pela primeira vez, em uma rotatória no bairro do Carumbé. Eu estava indo almoçar, quando vi aquela figura parada sob o sol escaldante. Uma figura igual a tantas outras que vemos pelas ruas, exceção feita a um detalhe: o cidadão segurava um gramofone.
O gramofone é um objeto que já não faz mais parte da nossa sociedade e do nosso imaginário. Inventado no século retrasado, ele foi substituído por diversas tecnologias mais modernas. É possível que muitas pessoas tenham olhado o objeto segurado pelo cidadão e não soubessem o seu nome e não entendessem a sua função. E quem conhece um gramofone, espera encontrá-lo em um museu, um antiquário, no acervo pessoal de algum colecionador. Jamais nos braços de alguém em uma rotatória ensolarada do Carumbé.
Passando pelo cidadão, reparei que na base do gramofone estava afixado um papel com a palavra “Vendo”. A situação me pareceu ainda mais estranha. Quem em tempos atuais teria um gramofone para vender? E, quem pensaria na ideia de vender a antiguidade no meio da rua, em um contorno aleatório.
No mesmo dia, quando voltava do almoço, percebi que o vendedor de gramofone continuava no mesmo lugar. Seu aparelho não havia sido vendido. Comecei a imaginar se a cena era real, ou se era uma miragem provocada pelo calor. Se ele não era o protagonista de algum quadro de programa de televisão. Se ele era um artista no meio de uma intervenção urbana. Se ele praticava um desses golpes divulgados por e-mail. Se ele protestava contra alguma coisa.
Minha cabeça admitia mil hipóteses, exceção a de que ele realmente tivesse um gramofone para vender no Carumbé. Poderia ser uma réplica que toca MP3, uma caixa decorada. Um gramofone é que não poderia ser.
No dia seguinte, ele já não estava mais lá. E eu poderia me esquecer dele. Mas, uma semana depois eu o encontrei novamente. O vendedor de gramofone não estava mais na rotatória do Carumbé, mas sim em uma rua escondida do bairro Boa Esperança. Uma rua sem movimento. Ele continuava lá, com o seu aparelho em cuja base se mantinha afixado o papel escrito “Vendo”.
A hipótese da farsa voltou a minha cabeça. Ninguém pode estar tão desesperado assim, para tentar vender um gramofone por dias a fio, sob o sol cuiabano. Seria mais fácil procurar alguma loja especializada, com a probabilidade de conseguir um preço mais justo, com menos trabalho. Qualquer hipótese me parecia mais razoável. Ele poderia estar fazendo um documentário, fazendo um laboratório para uma peça de teatro contemporâneo, não sei.
Ou será que ele apenas estava realmente precisando de dinheiro e a única coisa que ele tinha para vender era um gramofone? E a única maneira que ele pensava em fazer isso era enfrentar o sol e torcer para que alguém parasse o carro e falasse: “um gramofone! É justamente disso que eu preciso”?
Quem sabe? Nunca mais o encontrei. Espero que ele tenha alcançado o seu objetivo, seja ele qual for.
O gramofone é um objeto que já não faz mais parte da nossa sociedade e do nosso imaginário. Inventado no século retrasado, ele foi substituído por diversas tecnologias mais modernas. É possível que muitas pessoas tenham olhado o objeto segurado pelo cidadão e não soubessem o seu nome e não entendessem a sua função. E quem conhece um gramofone, espera encontrá-lo em um museu, um antiquário, no acervo pessoal de algum colecionador. Jamais nos braços de alguém em uma rotatória ensolarada do Carumbé.
Passando pelo cidadão, reparei que na base do gramofone estava afixado um papel com a palavra “Vendo”. A situação me pareceu ainda mais estranha. Quem em tempos atuais teria um gramofone para vender? E, quem pensaria na ideia de vender a antiguidade no meio da rua, em um contorno aleatório.
No mesmo dia, quando voltava do almoço, percebi que o vendedor de gramofone continuava no mesmo lugar. Seu aparelho não havia sido vendido. Comecei a imaginar se a cena era real, ou se era uma miragem provocada pelo calor. Se ele não era o protagonista de algum quadro de programa de televisão. Se ele era um artista no meio de uma intervenção urbana. Se ele praticava um desses golpes divulgados por e-mail. Se ele protestava contra alguma coisa.
Minha cabeça admitia mil hipóteses, exceção a de que ele realmente tivesse um gramofone para vender no Carumbé. Poderia ser uma réplica que toca MP3, uma caixa decorada. Um gramofone é que não poderia ser.
No dia seguinte, ele já não estava mais lá. E eu poderia me esquecer dele. Mas, uma semana depois eu o encontrei novamente. O vendedor de gramofone não estava mais na rotatória do Carumbé, mas sim em uma rua escondida do bairro Boa Esperança. Uma rua sem movimento. Ele continuava lá, com o seu aparelho em cuja base se mantinha afixado o papel escrito “Vendo”.
A hipótese da farsa voltou a minha cabeça. Ninguém pode estar tão desesperado assim, para tentar vender um gramofone por dias a fio, sob o sol cuiabano. Seria mais fácil procurar alguma loja especializada, com a probabilidade de conseguir um preço mais justo, com menos trabalho. Qualquer hipótese me parecia mais razoável. Ele poderia estar fazendo um documentário, fazendo um laboratório para uma peça de teatro contemporâneo, não sei.
Ou será que ele apenas estava realmente precisando de dinheiro e a única coisa que ele tinha para vender era um gramofone? E a única maneira que ele pensava em fazer isso era enfrentar o sol e torcer para que alguém parasse o carro e falasse: “um gramofone! É justamente disso que eu preciso”?
Quem sabe? Nunca mais o encontrei. Espero que ele tenha alcançado o seu objetivo, seja ele qual for.
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