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O quão triste estaremos quando tudo isso terminar

O ser humano é um otimista nato. Mesmo quem acha que tudo vai dar errado, no fundo, vê isso como uma estratégia para tudo dar certo.

Quando a pandemia de coronavírus se fixou no território nacional e todos estávamos impactados com as imagens italianas de hospitais lotados e caminhões carregando corpos, fizemos conjecturas sobre como seria o mundo quando tudo isso acabasse.

Estávamos também impressionados com as cenas de solidariedade, com as músicas nas janelas, e, tomados pela humanidade que ainda habita em nós, fantasiamos um novo mundo mais coletivo, onde cada momento fosse mais aproveitado e cada ser vivo fosse mais respeitado.

Esse pensamento positivo já é passado. A cada dia fica mais claro que a situação não vai melhorar. A pandemia foi tomada pelo debate político e, como qualquer drama da nossa sociedade, foi possuída pela banalidade. As mortes não impactam mais e viraram uma fria estatística cotidiana. Especialistas tentam explicar com novos termos como estamos perdidos, mas pouco importa.

A vida tenta volta para sua normalidade, esse novo normal que consiste em voltar para onde estávamos, só que convivendo com a morte alheia. Os bares estão lotados, as festas não terminam, toda distribuidora é um ponto de aglomeração com as pessoas bebendo cerveja, ignorando o uso de máscaras, vivendo o novo normal sem qualquer peso na consciência.

Um dia isso tudo vai passar, se realmente passar. As vacinas podem ser bem-sucedidas, os carnavais vão voltar, quem ainda guarda um resto de humanidade vai se reencontrar e matar a saudade. Mas o quão triste estaremos? Como mensurar a alegria perdida nesses dias trancados em casa, acompanhando a morte alheia, consumindo nossa energia na revolta com a falta de empatia alheia.

Vejo a repercussão e a tristeza do meio jornalística, futebolístico e musical com a morte do Rodrigo Rodrigues. Quando tudo isso acabar, ele não estará mais no Troca de Passes proporcionando alguma diversão. A voz de Morais Moreira nunca mais vai cantar. Quando eu subir as escadas do meu trabalho o Seo Batista não estará lá para comentar a rodada do futebol.

Muitas vozes estarão para sempre caladas e muitas mãos jamais irão se encontrar. Se isso tudo um dia acabar, não há otimismo suficiente para prever qualquer melhora. Estaremos muito mais tristes, vivendo uma tristeza imensurável.

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