Entre o ano de 1984, quando apareceu na casa dos meus pais no Piauí, e o dia 16 de dezembro de 2019, quando morreu em Cuiabá, a vida do papagaio Cacá foi bem documentada.
Apareceu já falando e assoviando algumas coisas, aparentemente perdido e com um dono jamais encontrado. Viveu mais algum tempo no Piauí até se mudar para o interior do Rio de Janeiro. Se mudou para Cuiabá em março de 1988, ao lado da família da qual já fazia parte.
Chegou a dividir um viveiro com outros três papagaios: Keké - que desapareceu em determinado momento do ano de 1992, Azul - que precisou ser doado, e Kikinho, seu parceiro extremamente violento, que não aceitava o convívio de outros papagaios, além de Cacá.
Na peregrinação por consultórios médicos em busca de atendimento para sua moléstia que acabaria se mostrando fatal, descobri que papagaios são seres monogâmicos. Então, de certa forma, Cacá e Kikinho eram um casal. A informação faz ainda mais sentido se levarmos em conta que em algum momento do ano de 2003 a família foi surpreendida pelo fato de que Kikinho colocou ovos e se transformou em Kikinha. Os ovos seguiram sendo colocados nos anos seguintes (não deram em nada e se tivessem dado, é provável que a reprodução de papagaios em cativeiro parasse no Fantástico). Kikinha morreu alguns anos depois e Cacá viveu sozinho desde então. Tentaram introduzir outro papagaio em seu viveiro, mas eles não se deram bem, provavelmente porque é difícil para um viúvo superar o seu luto. Enfim, descobrimos quase postumamente que Cacá viveu como viúvo nos últimos dez anos de sua vida e, parando para pensar agora, chega a ser triste essa história.
O papagaio escapou do viveiro algumas vezes, quando era mais jovem. Cantava louvores evangélicos com a vizinha da frente e ria quando alguém tropeçava, ou quando os vizinhos de trás brigavam. Assoviava o hino nacional, mas a sequência foi ficando mais curta a cada ano, até desaparecer. Dizia Oi Cacá, Dá o Pé Loro e assovios curtos. Imitava tosses e pigarros e risadas de pessoas que já estavam mortas há 20 anos.
O prenúncio do fim se deu em uma segunda-feira, quando ele se mostrou quieto e sem vontade de conversar, embora ainda aparentasse estar saudável. Dois dias depois passou a apoiar o bico para se manter em pé, andar no chão e dormir em sua casinha ao longo do dia. Na quinta-feira foi internado em um hospital e diagnosticado com pneumonia e anemia profunda. Recebeu uma transfusão de sangue que animou seu corpo, mas depois seguiu definhando até morrer na segunda-feira. Segundo a veterinária, papagaios são extremamente resistentes e, quando dão algum sinal de fraqueza, é porque a situação já é grave.
O sexo de Cacá jamais será descoberto. Por mais que se suponha que ele seja macho, uma vez que convivia com uma fêmea que botou ovos, e levando em conta que ele nunca botou ovos, isso não significa muita coisa. A monogamia de papagaios envolve relações entre indivíduos do mesmo sexo.
A idade do papagaio é um mistério ainda maior. Sabemos que ele viveu 35 anos conosco e que já era adulto quando virou um membro da família. Mas, jamais saberemos nada de sua vida pregressa. Por onde andou até cair na casa de dois jovens veterinários tentando a sorte a 2.600 km de casa. Se nasceu em alguma mata do Piauí, região onde papagaios são encontradas nas matas. Se nasceu em cativeiro. Quando foi capturado, como foi adestrado. Por quantas casas passou, quantos anos viveu antes, se seus antigos donos sentiram falta dele.
Dúvidas de outros tempos, da época em que as pessoas criavam papagaios, em que era normal ter um animal silvestre em casa, um bicho que é capaz de ver você nascer e só morrer quando você tiver 32 anos.
Apareceu já falando e assoviando algumas coisas, aparentemente perdido e com um dono jamais encontrado. Viveu mais algum tempo no Piauí até se mudar para o interior do Rio de Janeiro. Se mudou para Cuiabá em março de 1988, ao lado da família da qual já fazia parte.
Chegou a dividir um viveiro com outros três papagaios: Keké - que desapareceu em determinado momento do ano de 1992, Azul - que precisou ser doado, e Kikinho, seu parceiro extremamente violento, que não aceitava o convívio de outros papagaios, além de Cacá.
Na peregrinação por consultórios médicos em busca de atendimento para sua moléstia que acabaria se mostrando fatal, descobri que papagaios são seres monogâmicos. Então, de certa forma, Cacá e Kikinho eram um casal. A informação faz ainda mais sentido se levarmos em conta que em algum momento do ano de 2003 a família foi surpreendida pelo fato de que Kikinho colocou ovos e se transformou em Kikinha. Os ovos seguiram sendo colocados nos anos seguintes (não deram em nada e se tivessem dado, é provável que a reprodução de papagaios em cativeiro parasse no Fantástico). Kikinha morreu alguns anos depois e Cacá viveu sozinho desde então. Tentaram introduzir outro papagaio em seu viveiro, mas eles não se deram bem, provavelmente porque é difícil para um viúvo superar o seu luto. Enfim, descobrimos quase postumamente que Cacá viveu como viúvo nos últimos dez anos de sua vida e, parando para pensar agora, chega a ser triste essa história.
O papagaio escapou do viveiro algumas vezes, quando era mais jovem. Cantava louvores evangélicos com a vizinha da frente e ria quando alguém tropeçava, ou quando os vizinhos de trás brigavam. Assoviava o hino nacional, mas a sequência foi ficando mais curta a cada ano, até desaparecer. Dizia Oi Cacá, Dá o Pé Loro e assovios curtos. Imitava tosses e pigarros e risadas de pessoas que já estavam mortas há 20 anos.
O prenúncio do fim se deu em uma segunda-feira, quando ele se mostrou quieto e sem vontade de conversar, embora ainda aparentasse estar saudável. Dois dias depois passou a apoiar o bico para se manter em pé, andar no chão e dormir em sua casinha ao longo do dia. Na quinta-feira foi internado em um hospital e diagnosticado com pneumonia e anemia profunda. Recebeu uma transfusão de sangue que animou seu corpo, mas depois seguiu definhando até morrer na segunda-feira. Segundo a veterinária, papagaios são extremamente resistentes e, quando dão algum sinal de fraqueza, é porque a situação já é grave.
O sexo de Cacá jamais será descoberto. Por mais que se suponha que ele seja macho, uma vez que convivia com uma fêmea que botou ovos, e levando em conta que ele nunca botou ovos, isso não significa muita coisa. A monogamia de papagaios envolve relações entre indivíduos do mesmo sexo.
A idade do papagaio é um mistério ainda maior. Sabemos que ele viveu 35 anos conosco e que já era adulto quando virou um membro da família. Mas, jamais saberemos nada de sua vida pregressa. Por onde andou até cair na casa de dois jovens veterinários tentando a sorte a 2.600 km de casa. Se nasceu em alguma mata do Piauí, região onde papagaios são encontradas nas matas. Se nasceu em cativeiro. Quando foi capturado, como foi adestrado. Por quantas casas passou, quantos anos viveu antes, se seus antigos donos sentiram falta dele.
Dúvidas de outros tempos, da época em que as pessoas criavam papagaios, em que era normal ter um animal silvestre em casa, um bicho que é capaz de ver você nascer e só morrer quando você tiver 32 anos.
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