Pular para o conteúdo principal

Novos Walters

Fomos bons amigos pelo tempo em que vivemos juntos. Nossa amizade deve ter durado bem entre a oitava série e o fim do segundo grau, tempo em que convivíamos diariamente, fazíamos trabalhos em dupla e em grupos. Éramos um grupo feliz nas nossas ideias, dúvidas, capacidades e incapacidades.

O segundo grau terminou e começamos a nos afastar, como eu sempre me afasto das pessoas com quem não tenho convívio diário. Nunca sei se isso ocorre por minha culpa, por culpa das pessoas, de todos nós, ou se o mundo é que assim. Mas ainda nos encontrávamos com alguma frequência, para jogar bola, sinuca, visitar um amigo doente ou em alguma festa. Compartilhávamos algumas conquistas comuns a nossa idade, como a carteira de motorista. Lembrávamos do que vivemos juntos, as bebidas e as festas que nunca mais são iguais as que fazíamos quando tínhamos 16 anos.

Ele foi na minha formatura, eu fui na sua e então não sei mais. O tempo passou e já não saberia dizer quando foi a última vez que eu o vi, nem que tenha sido em alguma vez por engano. Vez por outra ainda nos falávamos em algum meio virtual, mas com frequência esparsa.

Convidei-o para o meu casamento. Talvez eu poderia não ter o convidado e ele talvez não soubesse, se soubesse não ficaria chateado, mas resolvi manter o contato com o grupo do colégio de tantos anos atrás. Após um primeiro sinal positivo, ele me comunicou que não poderia ir. Havia se mudado para outra cidade e, enfim, não poderia ir.

Não sei dizer se fiquei chateado, talvez eu não me importasse. Mas terminada a breve troca de mensagens, tive a sensação de que nunca mais iríamos nos falar novamente. Que ali se terminava oficialmente uma história que já estava adormecida a tanto tempo. Que definitivamente nos tornávamos ecos de um mundo que conhecíamos a um tempo atrás e um dia, se nós encontrássemos, talvez não soubéssemos os nomes um dos outros, como cantaria Ray Davies. Seríamos Walters um para o outro.

Não tenho como negar que o pensamento foi melancólico.

Comentários

Postagens mais visitadas

Oasis e a Cápsula do Tempo

Não dá para entender o Oasis pensando apenas na relevância das suas músicas, nos discos vendidos, nos ingressos esgotados ou nas incontáveis exibições do videoclipe de Wonderwall na MTV. Além das influências musicais, das acusações de plágio e das brigas públicas, o Oasis faz parte de um fenômeno cultural (um pouco datado, claro), mas é uma banda que captou o espírito de uma época e transformou isso em arte, promovendo uma rara identificação com seus fãs. Os anos 1990 foram marcados por problemas econômicos no mundo inteiro. Uma juventude já desiludida não via muitas perspectivas de vida. A Guerra Fria havia acabado, uma nova revolução tecnológica começava, o Reino Unido vivia uma crise pós governo Thatcher e nesse cenário surge um grupo cantando letras incrivelmente ousadas para meros desconhecidos.  Definitely Maybe, primeiro disco do grupo, fala sobre curtir a vida de maneira meio sem propósito e sem juízo. A diversão que só vem com cigarros e álcool, o sentimento supersônico de...

Oasis de 1 a 7

Quando surgiu em 1994, o Oasis rapidamente se transformou em um fenômeno midiático. Tanto por suas canções radiofônicas, quanto pela personalidade dos irmãos Gallagher. Eles estiveram na linha frente do Britpop, movimento que redefiniu o orgulho britânico. As letras arrogantes, o espírito descolado, tudo contribuiu para o sucesso. A discografia da banda, no entanto, não chega a ser homogênea e passa a ser analisada logo abaixo, aproveitando o retorno do grupo aos palcos brasileiros após 16 anos.  Definitely Maybe (1994) O primeiro disco do Oasis foi durante muito tempo o álbum de estreia mais vendido da história do Reino Unido. Foi precedido por três singles, sendo que dois deles são clássicos absolutos - Supersonic e Live Forever . O vocalista Liam Gallagher cantava em algum lugar entre John Lennon e Ian Brown, enquanto o som da banda bebia de quase tudo o que o Reino Unido havia produzido nos 30 anos anteriores (Beatles, T. Rex, Sex Pistols, Smiths, Stone Roses). O disco começa c...

Somos todos Leicester

O que era inacreditável, o que parecia impossível agora é verdade. O Leicester é o campeão inglês da temporada 2015-16. Incrível que o título tenha vindo de maneira até confortável, com duas rodadas de antecedência. Incrível que mesmo com a folga na tabela e a liderança estável nas últimas rodadas, era impossível acreditar que o título realmente viria. Parecia que a qualquer momento os Foxes poderiam desabar. O que mais falar sobre esse time? Formado por uma série de refugos, jovens que jamais explodiram, uma ou outra promessa. Filho de goleiro, zagueiro jamaicano e zagueiro alemão grosso, atacante japonês, atacante que até outro dia jogava no futebol amador. Não há nada parecido com o que Leicester fez nesse ano na história do futebol. Talvez na história do esporte. O título do Leicester é uma das maiores façanhas da história da humanidade. Não há o que falar, o que teorizar. Só resta olhar esse momento histórico e aceitar que às vezes o impossível acontece. Que realmente nada é i...