Pular para o conteúdo principal

A Northern Soul - o grande disco do Verve

Quando o The Verve estourou nas paradas mundiais com o hit Bittersweet Symphony, em 1997, pouca gente sabia da história da banda até então. Pouca gente conhecia os tumultos em hotel, as brigas, a vida louca que tornava o Verve uma espécie de sobrevivente de sua época.

Urban Hymns, o disco que da já citada BSS, continha ainda outros três singles poderosos - Sonnet, The Drugs Don't Work e Lucky Man, além de mais um punhado de belas canções. Não é a toa que fez sucesso e que ainda hoje muita gente acredite que este é o único disco do Verve. Mesmo assim, não é por síndrome de underground que acredito que este não é o melhor disco do The Verve. Urban Hymns é muito mais um disco de Richard Ashcroft, do que um trabalho do grupo.

Formado no início da década de 90, ainda como apenas 'Verve', a força do grupo sempre esteve no equilíbrio entre a guitarra cósmica de Nick McCabe e as interpretações fortes e letras profundas de Richard Ashcroft. O grupo lançou três singles, pérolas como A Man Called Sun e um bom e climático primeiro disco. Mas foi em 1995, há 20 anos, que o grupo lançou sua grande obra: A Northern Soul. Um disco intenso, pesado, profundo. Foi quando a banda melhor se equilibrou entre seus dois polos criativos.

O disco começo de maneira intensa, com quatro grandes canções. A primeira delas é A New Decade em que McCabe parece estar torcendo sua guitarra quando a voz anasalada de Ashcroft entra gritando "A New Decade! The radio plays the sounds we made" e logo começa a mostrar como esse é um disco depressivo. Ele se pergunta "Por quanto tempo eu vou correr? De quem eu estou correndo?".

This is Music, a segunda faixa, é um dos primeiros pequenos sucessos da banda com sua guitarra nervosa e cheia de ecos enquanto Ashcroft caminha entre a autoafirmação e o sentimento de perseguição. No final ele ratifica: Jesus nunca me salvou e ele nunca vai te salvar, você sabe disso.

A seguir vem On Your Own, a primeira balada do disco que não merece outra definição que não seja: desesperada. Amor desiludido, coração quebrado, muitos trechos cortantes sobre a base de violão, dos quais eu destaco o bridge "Tudo o que eu quero é alguém que preencha o buraco da vida que eu conheço. Entre a vida e a morte, quando nada mais importa, você quer saber?".

So it goes se arrasta por seis minutos e Ashcroft questiona "Você me mostrou coisas que eu não queria ver. Eu não acredito que o amor é livre". No final ele se certifica: "Mais um drinque e eu não vou perdê-la". Sim, o vocalista passava por um relacionamento bastante conturbado.

A faixa título é provavelmente o momento mais arrastado do disco com os pedidos de Ashcroft para morrer sozinho em sua cama, seguidos pela quase instrumental Brainstorm Interlude. Depois temos Drive You Home um momento de calma sobre um homem que queria levar sua namorada para casa, dizer as coisas que devia dizer, mas acabou voltando apenas ao mesmo lugar. "Nós não conversamos. Apenas dançamos em nossas mentes", canta.

Então chega o grande momento do disco. History pode ser injustamente tratada como uma precursora de Bittersweet, pelo seu até então inédito uso de cordas. Mas History é muito mais do que isso. É quase um tratado sobre a vida e a morte, uma saga melancólica pelas ruas solitárias que passam por trás do Rio Tâmisa. São cinco minutos e vinte cinco minutos intensos, belos, daqueles em que a música é envolta por um silêncio respeitoso e o mundo parece parar para que a canção toque enquanto o coração está prestes a sair pela boca. "But you are weak and so am I? Let's pick it up, let's even try to live today, so why don't smile, don't dream away your life".

A Northern Soul poderia ter acabado por aqui, mas ainda restam quatro canções. No Knock on my door, com uma presença maior de guitarras e uma letra que parece falar da primeira experiência sexual de um homem, Life's an ocean com uma linha de baixo marcante e Stomy Clouds. Para finalizar uma faixa instrumental sem nome, em que McCabe gasta todo o reverb da sua guitarra.

Dê uma chance para esse disco que você não vai se arrepender.

Comentários

Postagens mais visitadas

Aonde quer que eu vá

De vez em quando me pego pensando nisso. Como todos sabem, Herbert Vianna, dos Paralamas do Sucesso, sofreu um acidente de avião em 2001. Acabou ficando paraplégico e sua mulher morreu. Existe uma música dos Paralamas, chamada "Aonde quer que eu vá" que é bem significativa. Alguns trechos da letra: "Olhos fechados / para te encontrar / não estou ao seu lado / mas posso sonhar". "Longe daqui / Longe de tudo / meus sonhos vão te buscar / Volta pra mim / vem pro meu mundo / eu sempre vou te esperar". A segunda parte, principalmente na parte "vem pro meu mundo" parece ter um significado claro. E realmente teria significado óbvio, se ela fosse feita depois do acidente. A descrição do acidente e de estar perdido no mar "olhos fechados para te encontrar". E depois a saudade. O grande detalhe é que ela foi feita e lançada em 1999. Dois anos antes do acidente. Uma letra que tem grande semelhança com fatos que aconteceriam depois. Assombroso.

Ziraldo e viagem sentimental por Ilha Grande

Em janeiro de 1995 pela primeira vez eu saí de férias em família. Já havia viajado outras vezes, mas acho que nunca com esse conceito de férias, de viajar de férias. Há uma diferença entre entrar em um avião para ir passar uns dias na casa dos seus tios e pegar o carro e ir para uma praia. Dormir em um hotel. Foi a primeira vez que eu, conscientemente, dormi em um hotel. Contribui para isso o fato de que, com sete anos, eu havia acabado de terminar a primeira série, o ano em que de fato eu virei um estudante. Então, é provável que pela primeira vez eu entendesse o conceito de férias. Entramos em uma Parati cinza e saímos de Cuiabá eu, meus pais, minha prima e minha avó. Ao mesmo tempo em que essas eram as minhas primeiras férias, elas eram também a última viagem da minha avó. A essa altura ela já estava com um câncer no pâncreas e sem muitas perspectivas de longo prazo. Disso eu não sabia na época. Mas ela morreu cerca de um ano depois, no começo de 1996, após muitas passagens pelo hos

Pattie Boyd

Pattie Boyd O romance envolvendo George Harrison, Pattie Boyd e Eric Clapton é um dos mais conhecidos triângulos amorosos da história. Sempre achei o caso interessante. A princípio, a visão que nós temos é bem simplista. Pattie trocou o sensível George Harrison, aquele que lhe cantou a sentimental Something na cozinha, pelo intempestivo Eric, aquele que a mostrou a passional Layla na sala. E se há uma mulher irresistível neste mundo, esta mulher é Pattie Boyd. Só que o trio Boyd-Harrison-Clapton é apenas a parte mais famosa de uma série de relações amorosas e traições, que envolveram metade do rock britânico da época. E o que eu acho incrível, é que todos continuaram convivendo ao longo dos anos. George Harrison Pattie Boyd era uma modelo que fazia figuração em um vagão de trem durante a gravação de uma cena de A Hard Day’s Night, o primeiro filme dos Beatles. George era justamente um Beatle. Eric Clapton era o deus da guitarra e converteu vários fãs em suas inúmeras bandas