Pular para o conteúdo principal

Sonhando com a Guerra Civil

Vez por outra, surge por aí um vídeo em que um cidadão aparentemente demente é entrevistado em um programa de TV. Entre as diversas alucinações proferidas pelo indivíduo, está a afirmação de que o Brasil, infelizmente, só vai mudar quando partir para uma guerra civil, fazendo o trabalho que a ditadura militar não fez, de matar pelo menos 30 mil pessoas, começando com o presidente da República.

A entrevista é de meados dos anos 90 e o cidadão problemático era o até então desconhecido deputado federal Jair Bolsonaro. Infelizmente, o processo de amadurecimento da nossa democracia levou ao seu consequentemente apodrecimento e hoje esse homem é o presidente da República – o primeiro nome na lista de baixas de sua sonhada guerra civil.

Bolsonaro adora repetir o poder que sua caneta BIC tem, mas não tem nenhuma capacidade de tomar qualquer decisão útil para o país. Na falta de coisa melhor para fazer, o presidente vive alimentando o seu desejo recluso de provocar uma guerra civil brasileira.

Bolsonaro gosta da morte. Ele sente prazer em ver pessoas morrendo. Seus filmes favoritos certamente são aqueles em que todo mundo morre. Quando criança ele devia adorar destruir o cenário das suas brincadeiras e repetir babando que estavam todos mortos. E nunca saiu dessa fase.

Na campanha eleitoral o então candidato adorava repetir que não era médico, mas sim um capitão do exército. Portanto, sua especialidade não era salvar vidas, mas sim matar. Uma retórica vazia, já que sabemos que Bolsonaro era um paraquedista do Exército, cedo reformado. Nunca foi para a guerra e, se chegou a matar alguém, não foi exercendo sua função militar. Nunca pode sentir o prazer mórbido de ver a vida de alguém se esvaindo em consequência direta da sua ação.

Agora na presidência ele pode finalmente realizar seu sonho. É possível imaginar sua excitação ao ver as pessoas sufocadas em Manaus, em ler que 200 mil já morreram por conta de um vírus, um número muito além dos 30 mil sonhados por ele há quase 30 anos. Só isso explica sua atuação durante a pandemia.

Porque, sinceramente, é possível entender a estratégia de criar um inimigo imaginário que atente contra a moral e os bons-costumes, sejam eles os pedófilos invisíveis, a Rede Globo, as mamadeiras de piroca ou o comunismo – sendo que tudo isso é sinônimo na cartilha bolsonarista. Dá para entender a crença em qualquer panaceia para estimular que o mercado continue se movimentando. Mas, não dá para entender, por exemplo, o estímulo a não utilização de máscaras. Ou a Hashtag pedindo para o Brasil se aglomerar. Em último caso, não dá para entender a campanha antivacina. Uma vacina deveria ser o bálsamo e o júbilo de qualquer governante que sonha em ver as coisas retornando a sua normalidade, a economia crescendo e tudo mais.

Bolsonaro é um genocida, isso fica claro. Mas sua estratégia, o tempo todo, mostra que o vírus foi apenas uma oportunidade de acelerar seu projeto de morte. Seu grande sonho é promover uma guerra civil, matando pelo menos 30 mil pessoas, dessa vez provavelmente poupando a vida do presidente da República, que seria um dos comandantes do massacre.

O presidente vive do ódio e de estimular o ódio. Está sempre incitando seus apoiadores criando inimigos conspiratórios que irão estuprar seus filhos, invadir suas propriedades, mudar o sexo das crianças ou qualquer coisa parecida. Que há sempre um constante ameaça aos valores morais e materiais da sociedade cristã. Por outro lado, também incita o ódio entre seus adversários, falando besteiras todos os dias, menosprezando qualquer senso de urbanidade, enfim.

Para melhorar, ele a cada semana edita um novo decreto para facilitar o acesso da população às armas. Ele diz que só um povo armado pode ser livre, porque dessa forma pode se proteger dos tiranos, provavelmente assassinando prefeitos, governadores e afins. Ele quer uma população armada e com sangue nos olhos. Ele quer que o país entre em guerra civil e promova um massacre sem precedentes. Apenas dessa forma ele se dará por satisfeito, satisfazendo seu desejo de 30 anos, finalizando sua brincadeira de criança violenta.

Comentários

Postagens mais visitadas

Desgosto gratuito

É provável que se demore um tempo para começar a gostar de alguém. Você pode até simpatizar pela pessoa, ter uma boa impressão de uma primeira conversa, admirar alguns aspectos de sua personalidade, mas gostar, gostar mesmo é outra história. Vão se alguns meses, talvez anos, uma vida inteira para se estabelecer uma relação que permita dizer que você gosta de uma pessoa. (E aqui não falo de gostar no sentido de querer se casar ou ter relações sexuais com outro indivíduo). O ódio, por outro lado, é gratuito e instantâneo. Você pode simplesmente bater o olho em uma pessoa e não ir com a cara dela, ser místico e dizer que a energia não bateu, ou que o anjo não bateu, ou que alguma coisa abstrata não bateu. Geralmente o desgosto é recíproco e, se parar para pensar, poucas coisas podem ser mais bonitas do que isso: duas pessoas que se odeiam sem nenhum motivo claro e aparente, sem levar nenhum dinheiro por isso, sem nenhuma razão e tampouco alguma consequência. Ninguém vai se matar, brigar n...

Os 27 singles do Oasis: do pior até o melhor

Oasis é uma banda que sempre foi conhecida por lançar grandes b-sides, escondendo músicas que muitas vezes eram melhores do que outras que entraram nos discos. Tanto que uma coletânea deles, The Masterplan, é quase unanimemente considerada o 3º melhor disco deles. Faço aqui então um ranking dos 27 singles lançados pelo Oasis, desde o pior até o melhor. Uma avaliação estritamente pessoal, mas com alguns pequenos critérios: 1) São contados apenas o lançamentos britânicos, então Don't Go Away - lançado apenas no Japão, e os singles australianos não estão na lista. As músicas levadas em consideração são justamente as que estão nos lançamentos do Reino Unido. 2) Tanto a A-Side, quanto as b-sides tem o mesmo peso. Então, uma grande faixa de trabalho acompanhada por músicas irrelevantes pode aparecer atrás de um single mediano, mas com lados B muitos bons. 3) Versões demo lançadas em edições especiais, principalmente a partir de 2002, não entram em contra. A versão White Label de Columbia...

Tentando entender

Talvez a esquerda tenha que entender que o mundo mudou. A lógica da luta coletiva por melhorias, na qual os partidos de esquerda brasileiros se fundaram na reabertura democrática, não existe mais. Não há mais sindicatos fortes lutando por melhorias coletivas nas condições de trabalho. Greves são vistas como transtornos. E a sociedade, enfim, é muito mais individual. É uma característica forte dos jovens. Jovens que não fazem sexo e preferem o prazer solitário, para não ter indisposição com a vontade dos outros. Porque seria diferente na política? O mundo pautado na comunicação virtual é um mundo de experiências individuais compartilhadas, de pessoas que querem resolver seus problemas. É a lógica por trás do empreendedorismo precário, desde quem tem um pequeno comércio em um bairro periférico, passando por quem vende comida na rua, ou por quem trabalha para um aplicativo. Não são pessoas que necessariamente querem tomar uma decisão coletiva, mas que precisam que seus problemas individua...