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O mistério da cobertura global

A cobertura jornalística que a rede Globo oferece ao governo Bolsonaro será, em breve, um grande case de estudos em faculdades de comunicação pelo Brasil. A grande dúvida é: como pode a maior empresa de mídia do Brasil fazer uma cobertura tão oficialesca do atual governo, tratando os maiores absurdos como se fossem meras trivialidades, ao mesmo tempo em que o canal é fortemente atacado pelo núcleo de apoio bolsonarista?

A comparação um tanto quanto nonsense realizada no Jornal Nacional da segunda-feira, entre Bolsonaro e Lula, para falar sobre reflorestamento foi apenas mais um fato. Chocado mesmo, eu fiquei no dia em que o Jornal Hoje noticiou que os Estados Unidos deram o aval para que Eduardo Bolsonaro, o 03, fosse indicado embaixador do Brasil no país. Entre tantas citações banais, me chamou a atenção o momento em que Andréia Sadi disse “no Twitter, Carlos Bolsonaro, falou que a nomeação de Eduardo é um golaço do presidente”.

Não é preciso ter posição política para identificar a relevância jornalística de citar um tuíte do filho do presidente sobre a nomeação do seu próprio irmão feita pelo próprio pai: nenhuma. Quando essa citação é justamente do 02, o homem que ao que tudo indica coordena a massa de apoio governamental nas redes sociais, que trata a Rede Globo como um órgão comunista e chega a pregar o boicote ao canal, a situação fica ainda mais bizarra. (Isso sem falar da cobertura um tanto quanto heterodoxa do caso Vaza Jato e consequente prisão do hacker).

Fazer assessoria de imprensa travestida de imparcialidade jornalística não é nenhuma novidade para qualquer empresa. Só que, geralmente, essa decisão editorial vem acompanhada pelo retorno financeiro em forma de mídia publicitária, ou pelo menos pela expectativa pelo recebimento destes valores. Só que, ao que tudo indica, a Globo recebe menos dinheiro do que canais que tem menos audiência, mas venderam sua alma ao Governo, como Record e SBT.

Pensando sobre o caso, pensei em algumas hipóteses para explicar essa situação.

1) Há coisas que não sabemos
Enquanto achamos que Globo e Bolsonaro estão em pé de guerra, incluindo a milícia virtual do governo, na verdade os dois estão bem e acertados, recebendo dinheiro e ganhando tranquilidade. Ou quem sabe os dois permanecem nesse morde a assopra, sem fechar as portas, mas testando o limite e vendo quem, no final, vai ter mais garrafa para vender.

2) Tentativa de manter boas relações
Talvez as coisas não estejam tão boas assim, mas a Rede Globo quer manter as boas relações, na expectativa de que uma hora as coisas se acertem. Ou então, a família Marinho resolveu comprar o discurso das reformas e, para não atrapalhar o que julgam fundamental do país, concedem esta trégua jornalística. Ou ainda que a Globo tomou uma decisão comercial, de não desagradar ferozmente uma parcela de 30% da população, que é um público consumidor considerável.

3) Confundir imparcialidade
Está no manual básico do jornalismo e qualquer estudante é ensinado sobre isso em suas primeiras aulas: no jornalismo é preciso escutar os dois lados, ter pluralidade de fontes. Certo, mas e quando um dos lados age de maneira absurda e confronta a realidade? Se alguém contesta dados científicos baseados no senso comum, é dever do jornalismo dar voz a esse lado? Informar a posição de um familiar em uma questão de política externa nacional é ser plural? Dar voz a uma opinião completamente estapafúrdia e completamente contrária aos mínimos conceitos de humanidade é fazer jornalismo? Perguntas que podem parecer óbvias, mas que são um tanto complexa em um momento no qual a humanidade passa por uma grande transformação na maneira de se comunicar e em que, todos nós, somos cada vez mais movidos por emoções e emoções, mesmo que o ódio, geram dinheiro.

Enfim, um dia saberemos a resposta, ou pelo menos debateremos muito o assunto em artigos no comunique-se.

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