Pular para o conteúdo principal

O Passeio Alemão em Kazan

Quatro anos depois da narração de Galvão Bueno eternizar o passeio alemão contra o Brasil em Belo Horizonte, os germânicos voltaram a passear em campo enfrentando a Coreia do Sul em Kazan. Só que, se daquela vez o passeio retratava a facilidade encontrada em campo contra um adversário perdido, dessa vez o passeio mostra o descompromisso e a complacência alemã em campo.

A missão parecia em tese fácil: derrotar a Coreia do Sul, de preferência por dois gols de vantagem para não depender de mais nada. Vale ressaltar que, apesar de ser considerada um eterno cachorro morto, os sul-coreanos não são atropelados em um jogo de copa desde que levaram 5x0 da Holanda em 1998. Desde lá venceram Polônia, Portugal e Itália (os dois em jogos polêmicos), empataram com a França em 2006 e com a Rússia em 2014. Goleada sofrida apenas para a Argentina em 2010, em jogo puxado que desandou em dois contra-ataques argentinos no fim da partida.

Até por isso, a Alemanha deveria mostrar mais. O time europeu foi lento em campo e jogou uma partida absoluta horrível. Poderia ter vencido em cabeçadas de Gómez, Goretzka ou Hummels, pelo simples fato de ter mais qualidade e força que os asiáticos. Mas não fizeram por merecer. Özil teve uma atuação incrivelmente ruim e o mais impressionante é que permaneceu em campo até o fim, trotando e dando passes lentos de lado. Nenhuma infiltração, toque de bola rápido para vencer a defesa adversária. Nem a pressão de cruzamentos infinitos apareceu, exceção feita aos cinco minutos finais.

O resultado guarda alguma lógica: jogadores como Özil, Khedira, Thomas Müller e Boateng não vieram de boas temporadas europeias. Não dá para esperar que o milagre acontecesse e que todos jogassem bem na hora da Copa. Cada vez mais, não dá para imaginar que o torneio é um encontro mágico em que os nomes de sempre vão decidir as partidas. Quem tem minha idade, nunca viu os alemães jogarem tão mal em uma partida de copa do mundo. Pouquíssimas pessoas no mundo também viram essa cena: Alemanha eliminada na primeira fase de uma Copa. A última vez foi em 1938 e alguns poucos franceses, suíços e alemães octogenárias ou nonagenários que estavam no estádio podem dizer que viram.

Enquanto isso, os mexicanos foram atropelados pelos suecos e conseguiram avançar na bacia das almas. Nada poderia ser mais mexicano do que isso. Agora, vão lutar contra essa força terrível que os faz sempre avançar para perder nas oitavas de final. Contra o Brasil, não será fácil outra vez.

***

Com a eliminação da Alemanha, volta a tona a maldição dos campeões do mundo. Assim como os alemães, os espanhóis em 2014, os italianos em 2010 e, voltando um pouco, os franceses em 2002 caíram na primeira fase quando defendiam um título.

Mais do que uma maldição, ou uma bruxaria, todos esses acontecimentos chamam a atenção para outra coisa: como é difícil manter a competitividade em ciclos vitoriosos no esporte de alto rendimento. Seja por parte dos jogadores que ainda precisam manter a fome depois de alcançar seu máximo objetivo no esporte, ou mesmo do treinador. É difícil separar os heróis do título que ainda tem condição de oferecer mais, daqueles que estão acomodados. Perceber o campeão em má fase que ainda pode crescer quando a equipe precisar. Identificar os jovens que pedem passagem. Não é fácil.

Dessa vez, me parece que Özil, Khedira e Boateng não tinham condições de jogar a Copa. Müller e Neuer poderiam estar no elenco, mas precisavam de boas alternativas. Brandt parecia pedir passagem. Tal qual em 2014 Xavi e Xabi Alonso não estavam no auge da carreira e não davam a força de marcação necessária para proteger Ramos e Piqué, que jogavam sem a velocidade de cobertura de Puyol. Assim como Villa e Casillas já haviam passado do momento. Ou ainda a Itália de 2010 apostando em Zambrotta e Cannavaro na descendente, ou a França de 2002 que dependia muito de Zidane e demorou para perceber que apesar de campeões em 98, Leboeuf e Petit não podiam mais ser titulares.

Diagnóstico difícil. Existem exemplos de outros esportes coletivos em que equipes mantiveram uma longa supremacia. Mas o futebol de seleções é diferente de tudo. O único outro esporte coletivo em que os clubes são mais importantes que as seleções é o basquete, mas no basquete há os EUA que dominam tudo. A seleção de futebol é um apêndice glorioso para os atletas, mas não é a vida deles. Difícil se manter firme o tempo todo.

***

Exceção feita a poucos minutos do segundo tempo, o Brasil teve uma atuação consistente contra a Sérvia. Neymar foi menos individualista, Casemiro está muito bem na marcação, Paulinho apareceu no momento decisivo e a dupla de zaga foi consistente. Coutinho foi novamente brilhante, melhor jogador brasileiro da primeira fase.

Se fossemos Juan Carlos Osorio, as anotações em caneta vermelha seriam para: atenção no rebote defensivo. No pior momento do jogo, o Brasil não conseguiu ganhar nenhuma segunda bola, talvez porque Paulinho não tenha dado o combate suficiente. Outro risco é o cruzamento da esquerda em cima de Fágner. Jogada que pode ser muito perigosa, provavelmente não contra o México.

***

Sobre Suíça e Costa Rica, os costarriquenhos parecem me pagar o preço da covardia dos dois primeiros jogos. Principalmente contra a Sérvia, eles teriam condições de agredir um pouco mais e tentar um resultado melhor, mas preferiram se defender e especular o contra-ataque.

Até agora nessa Copa, apenas a Dinamarca avançou com um futebol mais covarde.

(Detalhe: com o recente gol polonês, se o Panamá marcar uma vez na Tunísia logo mais, todos os times do torneio terão marcado pelo menos duas vezes. Isso simplesmente nunca aconteceu antes).

Comentários

Postagens mais visitadas

Fuso Horário

Ela me perguntou sobre o fuso horário, se era diferente do local onde estávamos. Sim, informei que Mato Grosso está uma hora atrasado em relação ao Ceará. Perguntou se sentíamos alguma diferença, tive que falar que não. A pergunta sobre o fuso horário foi o suficiente para uma pequeno comentário sobre como lá no Ceará o sol se põe cedo e nasce cedo. Isso é exatamente ao contrário do Paraná, de onde ela veio, onde o sol se põe muito tarde. Ela demorou para se acostumar com isso. Não é nem seis da tarde e o sol se pôs. Não é nem seis da manhã e o sol já está gritando no topo do céu. Pensei por um instante que esse era um assunto de interesse dela. Que ela estava ali guiando turistas até um restaurante não facilmente acessível em Canoa Quebrada, mas o que ela gosta mesmo é do céu. Do movimento dos corpos, da translação e etc. Talvez ela pudesse pesquisar sobre o assunto, se tivesse o incentivo, ou se tivesse a oportunidade. Não sei. Talvez ela seja feliz na sua função atual. Talvez tenha ...

Os 50 maiores artilheiros do São Paulo no Século

(Até o dia 4 de fevereiro de 2024) 1) Luís Fabiano 212 gols 2) Rogério Ceni 112 gols 3) Luciano 87 gols 4) Jonathan Calleri 76 gols 5) França 69 gols 6) Dagoberto 61 gols 7) Borges 54 gols 8) Hernanes 53 gols 8) Lucas Moura 53 gols 10) Kaká 51 gols 11) Alexandre Pato 49 gols 12) Washington 45 gols 13) Reinaldo (Atacante 2001-2002) 41 gols 13) Grafite 41 gols 15) Danilo 39 gols 15) Diego Tardelli 39 gols 17) Souza 35 gols 18) Pablo 32 gols 18) Reinaldo (o lateral esquerdo) 32 gols 20) Hugo 30 gols 21) Brenner 27 gols 22) Gustavo Nery 26 gols 23) Alan Kardec 25 gols 24) Paulo Henrique Ganso 24 gols 25) Aloísio Chulapa 23 gols 26) Júlio Baptista 22 gols 26) Jorge Wagner 22 gols 26) Michel Bastos 22 gols 26) Aloísio Boi Bandido 21 gols 30) Cicinho 21 gols 30) Jadson 21 gols 30) Osvaldo 21 gols 33) Fábio Simplício 20 gols 33) Cícero 20 gols 33) Christian Cueva 20 gols 33) Robert Arboleda 20 gols 37) Thiago Ribeiro 19 gols 38) Amoroso 18 gols 39) Adriano Imperador 17 gols 39) Fernandinho 17 ...

Outras reações frustradas na Fórmula 1

No último domingo, certamente Lando Norris fez uma leve refeição antes de participar do Grande Prêmio do Brasil sonhando com uma virada que aumentaria suas chances de ser campeão do mundo. Poucas horas antes ele havia feito a pole position para a corrida, enquanto seu rival Max Verstappen largaria apenas na 17ª colocação.  Poderia sonhar com um vitória e com a possibilidade de seu rival chegar ali em uma distante quinta colocação. A distância de 44 pontos poderia cair para 29 e, aí, por mais que continuasse difícil ser campeão, não daria para negar que era uma chance. No entanto o que se viu no domingo foi completamente diferente. Contando com uma atuação primorosa e um pouco de sorte, Max Verstappen conseguiu a vitória em São Paulo. Lando, por outro lado viu tudo dar errado - largada ruim, fim do VSC na hora em que entrava no boxe, enfim, e chegou em oitavo. A reação virou um provável título de Verstappen na próxima corrida em Las Vegas - ainda acho mais provável o título na Sprin...