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O dia limite

Nós, que vivemos em Cuiabá, somos acostumados com o calor. Armamos-nos com ar-condicionado e rimos daqueles que se espantam com 36º, como se disséssemos "isso não é nada". Tratamos os 40º com normalidade e colocamos mangas compridas em qualquer dia mais ou menos dublado.

Somos acostumados com o sol, enfrentamos o sol pelas ruas em que andamos, usamos óculos escuros.

Mas há uma época por ano em que nós, que vivemos em Cuiabá, pensamos em desistir de tudo. Se pudéssemos, correríamos para longe. Essa época começa por agora e tem tempo indeterminado, vai até o dia em que uma chuva resolva cair.

Somos enganados, em um primeiro momento pensamos que o céu está nublado, mas não está. É fumaça. Muita fumaça. O sol não consegue aparecer por trás dessa camada cinza. O horizonte fica invisível, por trás da neblina. O cheiro da fuligem logo se agarra nas nossas narinas e até deixamos de o estranhar. A garganta seca e arranhada, os olhos irritados e as notícias de que as queimadas não param por aí.

Nessa época do ano temos a impressão de que estamos no inferno. Rimos do calor do começo do ano, quando o céu ainda esta azul. E a tendência é de que só piore, a previsão do tempo não trás notícias boas.

Vivemos nossa época anual de provação.
E ali deveria estar o sol.

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