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Quartas de derrotas comuns

Desde que eu me entendo por gente e acompanho futebol com um mínimo de discernimento, esta deve ser a primeira vez que o Brasil é eliminado de uma Copa do Mundo de maneira normal. Perdeu dentro do jogo porque assim é o esporte: alguém tem que perder. Não houve o ambiente de balada de 2006, o rancor de Dunga em 2010 e nem foi como em 2014, porque nunca mais haverá outro 2014.

O jogo foi equilibrado, com a Bélgica bem superior no primeiro tempo e o Brasil melhor no segundo. A equipe nacional jogou para empatar no segundo tempo, é verdade, mas a Bélgica jogou para fazer mais do que 2x0 no primeiro tempo. Os belgas aproveitaram melhor o momento de instabilidade brasileira após o gol contra de Fernandinho e o posicionamento de De Bruyne, Fellaini e Lukaku acabou por confundir a marcação brasileira.

Fernandinho teve uma jornada horrível. Suas costas foram uma festa para De Bruyne e Lukaku. O gol contra foi azar, mas não dá para descartar que tenha trazido à tona todos os demônios internos do massacre de 2014. Fernandinho foi talvez o pior nome em campo naquele 7x1 e repetiu a triste façanha em 2018. Pena para ele.

Aí não aparece Paulinho. O personagem oculto das duas tragédias pessoais e nacionais de Fernandinho. Assim como em 2014, faltou ao incisivo volante ajudar na recomposição. Se em 2014 Fernandinho ficou vendido contra Khedira, Kroos e Schweinsteiger, enquanto Paulinho esperava adiantado por uma bola que nunca ia chegar, o mesmo aconteceu desta vez. Paulinho esperava os rebotes que sempre chegam aos seus pés, mas que dessa vez ele não aproveitou, e o camisa 17 ficou ilhado em um revoltoso mar vermelho.

(Traído por minha memória, achei que Paulinho foi titular na partida contra a Alemanha em 2014. Ele começou aquele jogo no banco. Fernandinho era acompanhado por Luiz Gustavo. Ou seja, metade do que eu falei não valeu)

Poderão ser lamentados os gols perdidos por Paulinho, a bola na trave de Thiago Silva, o gol contra no início, as más finalizações de Firmino (em lance que teria que ser anulado por impedimento no início da jogada), Coutinho, Renato Augusto e a grande defesa de Courtois na derradeira finalização de Neymar. O camisa 10 brasileiro acabou uma vítima de si próprio, da atenção que ele busca e que não conseguiu corresponder. Perdeu quase todos os duelos individuais, enquanto que Hazard, do outro lado, venceu todos os 10 que teve.

A Ótima Geração BelgaⓇ avança as semifinais, justamente porque é muito boa. O time tem problemas defensivos, mas compensa com seu trio de ataque. Foi bem o técnico que apostou em dar mais consistência no meio de campo e abriu mão de Mertens, que pode ainda ser peça importante nos últimos dois jogos. Ao Brasil, resta manter o trabalho. Encontrar uma nova dupla de zaga (ou um companheiro para Marquinhos), melhorar as laterais, esperar o amadurecimento de Gabriel Jesus e que Neymar tome juízo um dia. Alisson, Marquinhos, Casemiro, Coutinho, Neymar e Jesus. Há uma base para 2022.

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Sem Cavani, dá para dizer que o Uruguai perde aproximadamente 30% do seu time. Suárez representaria mais 30%, a dupla de zaga outros 30% e o restante do time divide aqueles 10%.

Assim sendo, entrar desfalcado do camisa 21 tornou a missão celeste quase impossível. E de fato, por mais que Stuani seja um bom jogador, o desnível foi saltantes aos olhos. Suárez brigou feito um louco, Torreira - ótimo volante - se matou em campo e a dupla de zaga foi firme quase o tempo todo. A França venceu na esperteza de Varane, que antecipou a bola parada, e graças a Muslera. O sempre inseguro goleiro uruguaio acabou por entregar em sua última partida de Copa do Mundo.

Para os uruguaios, fica a busca eterna por um pouco mais de criatividade, já que é improvável que a mágica dupla nascida em Salto vá disputar todo o ciclo para 2018. O meio-de-campo se mostrou mais leve e rejuvenescido, mas falta uma jogada além da bola parada. Godín também está no fim de sua carreira, mas Giménez deve continuar como um forte pilar.

Os franceses avançam como o time que suscitava mais inspiração, mas é difícil exigir muito mais de um semifinalista. Griezmann tem feito copa muito regular, assim como Hernández. Lloris brilhou demais na única chance uruguaia na partida.

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Assistindo apenas o jogo de hoje, chega a parecer incrível que os suecos conseguiram marcar gols em todos os jogos anteriores da Copa. O time se dedica muito, Granqvist e Lindelof fizeram grande copa, Ekdal e Claesson correram muito, enfim, um time muito justo mas que acaba sempre finalizado pela ineficiência de Berg, Toivonen e Forsberg. Um triste fim para o esforço sueco.

Mesmo assim, Pickford foi personagem essencial na partida. Vejam vocês: um goleiro inglês fazendo boa copa. Algo que parecia uma lenda do futebol.

A bola área inglesa é certamente a mais forte vista em alguns anos nas Copas do Mundo. Um grupo de jogadores gigantes que armam uma movimentação louca e é quase impossível ganhar a bola no segundo pau de Maguire. Será uma arma fortíssima contra a Croácia.

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Os russos chegaram ao seu limite e foram eliminados apenas nos pênaltis. Abriram o placar em um chutaço do improvável Cheryshev, levaram o empate de Kramaric após grande jogada de Mandzukic (incrível como essa é uma copa de grandes centroavantes) e o jogo foi para a prorrogação.

Vida marcou um gol redentor e quando parecia que a Rússia não conseguiria nada, Mário Fernandes subiu em São Caetano par marcar o gol do empate. O próprio brasileiro perderia o pênalti decisivo, mas isso não apaga a grande copa do mundo que fez (uma copa com bons laterais direitos e poucos bons laterais esquerdos).

A Croácia consegue avançar para as semifinais e chega lá na condição de franco atiradora. A final mais lógica parece ser França e Inglaterra, mas, como diria o indeciso: tudo pode acontecer.

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Seleção das Quartas:

Jordan Pickford (Inglaterra); Mário Fernandes (Rússia), Harry Maguire (Inglaterra), Domagoj Vida (Croácia) e Ashley Young (Inglaterra); Daler Kuzyayev (Rússia) e Axel Witsel (Bélgica); Eden Hazard (Bélgica), Kevin De Bruyne (Bélgica) e Antoine Griezmann (França); Mario Mandžukić (Croácia).

Jogador da rodada: Jordan Pickford.

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Seleção da Copa até aqui, dessa vez em um 4-4-2, porque não dá para escalar só um centroavante.

Kasper Schmeichel (Dinamarca); Mário Fernandes (Rússia), Yerry Mina (Colômbia), Thiago Silva (Brasil) e Lucas Hernández (França); Eden Hazard (Bélgica), Luka Modrić (Croácia), N'Golo Kanté (França) e Kylian Mbappé (França); Harry Kane (Inglaterra) e Romelu Lukaku (Bélgica.

Bola de Ouro: Hazard
Bola de Prata: Harry Kane
Bola de Bronze: Schmeichel.

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