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Neymar e a Geração Belga

Nesta segunda-feira, o mundo pode viver em todos o esplendor as reações à geração belga. Depois de um primeiro tempo preguiçoso, em que podemos dizer que o Japão executou sua proposta de jogo melhor - apesar de os belgas estarem sempre perto da área, os nipônicos tiveram um começo de segundo tempo arrasador e abriram 2x0 em menos de 8 minutos.

Foi a senha para que todo um ressentimento relacionado a Grande Geração BelgaⓇ viesse a tona. A farsa estava enfim desmascarada. Analiso essa reação de duas maneiras.

A primeira trata de, mais do que um ódio aos belgas, um ódio ao enaltecimento do estrangeiro em detrimento ao local. Fellaini é o maior exemplo disso. Jogador folclórico, de difícil interpretação dentro do capo, mas que a cada gol ou passe bissexto é incluído no rol de grandes jogadores. É um ódio ao futebol pivote, ao futebol world class, ao hype da Premier League que abriga toda a seleção belga.

É difícil separar onde termina a qualidade e começa a empolgação. Veja o time belga que entrou em campo: Courtois; Kompany, Alderweireld e Vertonghen; Meunier, Witsel, De Bruyne e Carrasco; Hazard, Mertens e Lukaku. Não tem nenhum jogador ruim, Courtois é um grande goleiro, Kompany já foi um zagueiro excepcional, de Bruyne e Hazard são ótimos jogadores, Mertens e Lukaku são muito bons. Os outros não são nada demais, mas é um time bem equilibrado, principalmente porque é a Bélgica. Lembrem-se, é a Bélgica que tem como melhor resultado em copas um quarto lugar, vencendo apenas dois jogos no torneio. Para os padrões belgas é mais do que uma ótima geração.

O outro lado do ódio vem da relutância de alguns brasileiros em aceitar a existência de bons jogadores em outros países, principalmente em um país pouco tradicional. Daí vem a torcida pelo fracasso que confirme que a Bélgica é uma farsa, que De Bruyne seria reserva do Fortaleza e Hazard uma opção de segundo tempo para o Figueirense. Complexo de Vira Lata e de Rotweiller se fundem em um choque de opiniões contraditórias.

Bem, depois de parecer morta e de uma hora jogando sem objetividade, a Bélgica conseguiu reagir. Aliás, destaco o Maurício Noriega que no SporTV resolveu falar que a Bélgica sofria de espanholização e que ousava decretar morto o futebol "de toquinhos" da Espanha campeã em 2010, no que foi um grande exemplo de ignorância para agradar as massas sedentas por vingança.

Sim, existem times que jogam bem e que jogam mal dentro de várias propostas. A Espanha de 2010 jogou bem dentro de sua proposta de tocar a bola e essa de 2018 jogou muito mal dentro dessa proposta. A Costa Rica, por exemplo, jogou muito mal dentro da proposta de se retrancar e sair em velocidade e isso não faz com que a proposta de jogar na retranca esteja morta.

A reação belga acabou sendo um anticlímax para o exorcismo praticado nas redes sociais e fez surgir os entusiastas de planilhas futebolísticas que estavam em silêncio.

Sim, palmas para a virada belga. Nunca é fácil virar um 0x2 adverso (A última vez? Costa do Marfim contra Sérvia e Montenegro em 2006. Última vez em que uma seleção se viu perdendo por essa diferença e sendo eliminada? Alemanha contra a Inglaterra em 1970) . Destaque para a impulso japonês de tentar um gol de escanteio, mesmo com um time muito mais baixo que o europeu. Ceder um contra-ataque daqueles aos 48 do segundo tempo de uma oitava de final de Copa do Mundo, sendo que a prorrogação já batia às portas é indefensável. No mais, apesar do placar elástico, achei que esse foi um jogo que não demandou grande esforço para que os gols saíssem. No geral, essa é uma copa sem tanto esforço para um gol.

***

Neymar fez uma grande partida isso e está é uma difícil admissão para quem não suporta o cidadão. Mas a vida é assim, é possível ser uma pessoa insuportável e jogar muito. Ele pode arrancar para o gol duas vezes e também pular em campo depois de um lance maldoso, mas que não pareceu dolorido, de Layún. Aliás, geralmente quando sentimos dor, a tendência não é de se debater.

O Brasil sofreu muito no começo do jogo e Lozano e Vela infernizaram os laterais brasileiros. A proposta mexicana é de forçar a velocidade na hora do ataque. Mas, mesmo com o volume de jogo, os mexicanos não criaram grandes perigos. Depois de se acertar em campo, lá pelos 25 minutos, o Brasil passou a dominar e o gol virou uma questão de tempo.

Aliás, esse é o mérito da seleção de Tite. Dentro de um Copa, ninguém será perfeito o tempo todo. Existirão momentos de instabilidade, quando o adversário ganhar confiança, executar bem uma proposta, ou enfim, os diversos fatores que fazem com que um time passe a encaixotar o outro. O sonho do jogo absolutamente controlado é isso mesmo, um sonho. A seleção brasileira até agora resistiu bem a esses momentos, exceção feita a partida contra a Suíça, quando levou o gol de empate.

Willian renasceu para a vida a partir do segundo tempo e Thiago Silva tem sido exemplar até agora.

Do lado mexicano fica a boa atuação de Ochoa, este goleiro que nasceu para jogar em Copas do Mundo. Além da incrível síndrome: é a sétima vez seguida que os mexicanos caem nas oitavas. Em alguns casos como 1998 e 2014 foi impressionante, digna de uma maldição. Dessa vez, em 2018, tenho a impressão que eles não podem usar o "jogamos como nunca e perdemos como sempre".

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