Pular para o conteúdo principal

Aberto Retrô da Austrália

No começo, o Australian Open pareceu um tanto quanto decepcionante. Afinal, o fim do último ano deu a indicar que adentraríamos finalmente na época Murray/Djokovic de rivalidade no tênis e os primeiros dias em Melbourne derrubaram tudo. Um apagado Djokovic foi eliminado por Istomin logo na segunda rodada e até agora não dá pra entender como Murray foi atropelado pelo saque-voleio de Mischa Zverev.

Na chave feminina, em menor grau, a situação era parecida. Angelique Kerber a nova número 1 fez um campeonato apagado e foi eliminada sem brilho. Halep, Muguruza, nenhuma das candidatas a novas estrelas do circuito conseguiu ir longe. Apenas a interminável Serena Williams seguia em frente. Demorou um tempo até percebermos que este Australian Open foi uma espécie de janela temporal para o passado. Que era um evento destino a nostalgia dos grandes confrontos.

Foi apenas quando Venus Williams, navegando por uma chave relativamente tranquila  se colocou na semifinal que todos percebemos que o destino poderia nos brindar com um confronto entre as irmãs Williams na final. Não havia como torcer contra essa possibilidade e ela aconteceu.

Venus é apenas um ano mais velha do que Serena, mas essa diferença jogou a favor da primogênita no começo da carreira das duas. Duas negras dominando o circuito do tênis não deixava de ser uma novidade e os primeiros confrontos entre as duas ganharam grande apelo midiático. Venus dominou a irmã mais nova nos começo, apesar de Serena ter conquistado um Grand Slam primeiro. Venus venceu os três primeiros confrontos em grandes torneios, incluindo a primeira final entre as duas, US Open 2001. Serena venceu Roland Garros no ano seguinte.

Era o começo da rivalidade, antes que todos pudessemos perceber que Venus era "apenas" uma grande tenista, enquanto Serena era um gênio do esporte que iria dominar o circuito por um período impensável. Neste sábado as duas se enfrentarão pela 28ª vez, 15ª em um Grand Slam, nona vez em uma final desses torneios. Isso não acontecia desde 2009 - oito anos - e pode ser que seja a última vez. Vamos aproveitar a última vez.

***

Entre os homens, apenas quando as quartas-de-final se confirmaram é que nós percebemos o que o destino estava nos reservando. Foi quando Federer superou Berdych e Nishikori e estava nas quartas-de-final. Quando Nadal também chegou lá que percebemos que o maior clássico do tênis poderia ser disputado em uma final.

E aconteceu. Depois de duas semifinais muito disputadas, ele conseguiram chegar lá. Depois de sete anos Federer volta a uma final na Austrália. Nadal, depois de três e três anos sem disputar nenhum título de Grand Slam.

A rivalidade Federer/Nadal redefiniu o tênis a partir da metade da década passada. O suíço surgiu primeiro e se colocou como candidato ao posto de maior tenista da história. Dominou adversários de uma maneira jamais vista, até que Rafael Nadal surgiu em 2004. Primeiro o espanhol dominou os torneios no saibro e lentamente foi aumentando sua resistência na grama. O resultado foram os confrontos épicos nas finais de Wimbledon em 2007, vencida por Federer, e em 2008, vencida por Nadal naquele que é talvez o maior jogo de tênis da história. Apenas quem viu aquela partida ao vivo se lembra de como a partida foi impressionante em suas quase cinco horas de duração.

A rivalidade aumentou a exposição mundial do esporte, que ganhou uma audiência jamais vista. Atenção multiplicada com as subsequentes aparições de Djokovic e Murray, que levaram o esporte para um nível estratosférico de disputa.

Será o 35º confronto entre os dois, o 12º em Grand Slams, a nona final. Nadal tem vantagem de 6x2 nesse tipo de confronto, que não acontecia desde 2011. Seis anos e agora com um sendo o cabeça de chave nº 9 e o outro o nº 17 (em todos os confrontos anteriores, um dos dois sempre era o nº 1 do mundo).

Pode ser a última vez, é provável que seja a última vez. Vamos aproveitar também. Não é qualquer dia que você vê finais com os maiores ganhadores de Slams masculinos e femininos enfrentando seus maiores rivais.

(Para completar o momento retrô, os irmãos Bryan também voltam a uma final de Grand Slam após três anos).

Comentários

Postagens mais visitadas

O Território Sagrado de Gilberto Gil

Gilberto Gil talvez não saiba ou, quem sabe saiba, mas não tenha plena certeza, mas o fato é que ele criou a melhor música jamais feita para abrir um show. Claro que estou falando de Palco, música lançada no álbum Luar, de 1981 e que, desde então, invariavelmente abre suas apresentações. A escolha não poderia ser diferente agora que Gil percorre o país com sua última turnê, chamada "Tempo Rei" e que neste último sabado, 7 de junho, pousou na Arena Mané Garrincha, em Brasília.  "Subo neste palco, minha alma cheira a talco, feito bumbum de bebê". São os versos que renovam os votos de Gil com sua arte e sua apresentação. Sua alma e fé na música renascem sempre que ele sobe no palco. "Fogo eterno pra afugentar o inferno pra outro lugar, fogo eterno pra  consumir o inferno fora daqui". O inferno fora do palco, que é o seu território sagrado. Território define bem o espetáculo de Gil. Uma jornada por todos os seus territórios, da Bahia ao exílio do Rio de Janeir...

Aonde quer que eu vá

De vez em quando me pego pensando nisso. Como todos sabem, Herbert Vianna, dos Paralamas do Sucesso, sofreu um acidente de avião em 2001. Acabou ficando paraplégico e sua mulher morreu. Existe uma música dos Paralamas, chamada "Aonde quer que eu vá" que é bem significativa. Alguns trechos da letra: "Olhos fechados / para te encontrar / não estou ao seu lado / mas posso sonhar". "Longe daqui / Longe de tudo / meus sonhos vão te buscar / Volta pra mim / vem pro meu mundo / eu sempre vou te esperar". A segunda parte, principalmente na parte "vem pro meu mundo" parece ter um significado claro. E realmente teria significado óbvio, se ela fosse feita depois do acidente. A descrição do acidente e de estar perdido no mar "olhos fechados para te encontrar". E depois a saudade. O grande detalhe é que ela foi feita e lançada em 1999. Dois anos antes do acidente. Uma letra que tem grande semelhança com fatos que aconteceriam depois. Assombroso.

Do que eu gostaria de lembrar de Paris 2024

Da arrancada da Femke Bol na final do revezamento 4x400 misto. Ela já havia feito isso em campeonato mundial, todo mundo falava que ela podia fazer novamente, mas não tinha sido tão impressionante. Não tinha sido em Jogos Olímpicos. Os EUA precisavam abrir uma grande vantagem para segurar a Femke Bol no fim, diziam. Os EUA abriram essa vantagem, mas nada seria capaz de segura a holandesa. Até metade da volta ainda parecia impossível. No meio da última curva ela deixou uma belga para trás. No começo da reta foi a inglesa. Só faltava a americana e a ultrapassagem veio coisa de 20 ou 30 metros antes de chegada ainda. Impressionante. E a arrancada da Sifan Hassam? Ela já estava na história por conseguir três medalhas em Tóquio, nos 1.500, 5 mil e 10 mil metros. Em uma delas depois de cair no chão já perto do fim da prova. Agora, a Maratona? Qual é a lógica de alguém que corre mil e quinhentos metros ainda conseguir correr mais 40,6 mil? Qual é a lógica de, depois de 41 km corridos, arranca...