Pular para o conteúdo principal

Delpo

Juan Martín Del Potro surgiu como um furacão. Um gigante de 1,98m, La Torre de Tandil. Foi galopando pelas fases iniciais da carreira, até que chocou o mundo derrotando Roger Federer na final do US Open de 2009.

O suíço havia ganho as últimas cinco edições do torneio e durante uma sequência de 35 torneios entre 2006 e 2013, essa foi a última vez em que alguém fora do Big Four ganhou um Grand Slam. Foi também das raras vezes, talvez única, em que um mortal ganhou um título derrotando Federer e Nadal no mesmo torneio.

O jogo de Del Potro não era dos mais brilhantes, mas era lindo em sua eficiência e potência. Ele se segurava o quanto podia no backhand, para abrir a quadra na direita e poder atacar o forehand na corrida.

E seu forehand era um espetáculo. Um força da natureza. Um evento sobrenatural. Era previsível, mas inevitável. O golpe saia com uma força estratosférica, em ângulos perversos e locais inalcançáveis. Tenistas podem ter vários golpes, mas para Del Potro bastava um. Apenas um. (Não que ele só soubesse fazer isso, mas todo o restante do jogo era eclipsado por esta aparição extraterrestre. Quando Del Potro acertava o forehand na corrida, a reação de todos - público, plateia, até mesmo o adversário, era soltar um "uau").

E assim ele virou o número 4 do mundo. Mas quando parecia que seu voo estava apenas começando, veio uma lesão no pulso. Quase um ano parado, cheio de dúvidas e tratamentos, até o seu retorno.

Del Potro era como uma locomotiva, que demorava para pegar embalo, mas em 2012 ele estava de volta. Retornou ao Top 10, foi medalha de bronze nas Olimpíadas, semifinalista de Wimbledon, novamente número 4 do mundo. E lá veio outra lesão no pulso.

Quase dois anos fora, novas incertezas. Era impossível não compará-lo a Guga, o outro último fenômeno sul-americano do tênis. Só que Del Potro teve um segundo retorno.

Voltou sendo medalhista de prata nas Olimpíadas, derrotando Novak Djokovic na primeira rodada, Rafael Nadal na semifinal, perdendo um pequeno épico para Andy Murray na final.

Se faltava algo para ser idolatrado em sua terra natal, no fim do ano ele conquistou a primeira Copa Davis da Argentina, sendo peça fundamental. Derrubou Andy Murray, então o melhor do mundo, na terra de Murray, em Glasgow, na semifinal. Na final, contra todas as expectativas físicas, jogou três jogos em três dias, e foi fundamental no jogo 4, ao virar uma partida que perdia por 2x0 contra Marin Cilic.

Escalou o US Opem, quadrifinalista em 2016, semifinalista em 2017, finalista em 2018. Semifinalista em Roland Garros. Ganhou seu primeiro e único Masters 1000 em Indian Wells, derrotando Federer. Número 3 do mundo, talvez não fosse a melhor versão de Del Potro, mas continuava sendo um novo espetáculo. 

Então veio uma nova lesão, dessa vez no joelho.

Praticamente três anos se passaram com ele fora das quadra, até o anúncio do seu terceiro retorno. Contra todas as expectativas, ele logo esclareceu que, mais do que um retorno, era uma despedida.

Del Potro é desses caras emotivos, que não segura muito o choro. Em quadra, sua expressão variava entre o cansaço extremo e a desilusão total. Seus jogos ganhavam contornos épicos, suas vitórias eram extasiantes, mas suas derrotas eram lindas. Eram dramas. Eram argentinas. Seu coração ficava em quadra e ninguém duvidava que tinha dado o seu máximo. Invariavelmente acabava mais aplaudido que o vencedor.

Na última terça-feira foi derrotado em um torneio em casa. Chorou antes do último serviço. Foi ovacionado pela torcida. Deixou sua munhequeira pendurada na rede e espera viver uma vida sem as dores que o perseguiram nos últimos dois anos. Que tenha a felicidade que merece.

Comentários

Postagens mais visitadas

O Território Sagrado de Gilberto Gil

Gilberto Gil talvez não saiba ou, quem sabe saiba, mas não tenha plena certeza, mas o fato é que ele criou a melhor música jamais feita para abrir um show. Claro que estou falando de Palco, música lançada no álbum Luar, de 1981 e que, desde então, invariavelmente abre suas apresentações. A escolha não poderia ser diferente agora que Gil percorre o país com sua última turnê, chamada "Tempo Rei" e que neste último sabado, 7 de junho, pousou na Arena Mané Garrincha, em Brasília.  "Subo neste palco, minha alma cheira a talco, feito bumbum de bebê". São os versos que renovam os votos de Gil com sua arte e sua apresentação. Sua alma e fé na música renascem sempre que ele sobe no palco. "Fogo eterno pra afugentar o inferno pra outro lugar, fogo eterno pra  consumir o inferno fora daqui". O inferno fora do palco, que é o seu território sagrado. Território define bem o espetáculo de Gil. Uma jornada por todos os seus territórios, da Bahia ao exílio do Rio de Janeir...

Aonde quer que eu vá

De vez em quando me pego pensando nisso. Como todos sabem, Herbert Vianna, dos Paralamas do Sucesso, sofreu um acidente de avião em 2001. Acabou ficando paraplégico e sua mulher morreu. Existe uma música dos Paralamas, chamada "Aonde quer que eu vá" que é bem significativa. Alguns trechos da letra: "Olhos fechados / para te encontrar / não estou ao seu lado / mas posso sonhar". "Longe daqui / Longe de tudo / meus sonhos vão te buscar / Volta pra mim / vem pro meu mundo / eu sempre vou te esperar". A segunda parte, principalmente na parte "vem pro meu mundo" parece ter um significado claro. E realmente teria significado óbvio, se ela fosse feita depois do acidente. A descrição do acidente e de estar perdido no mar "olhos fechados para te encontrar". E depois a saudade. O grande detalhe é que ela foi feita e lançada em 1999. Dois anos antes do acidente. Uma letra que tem grande semelhança com fatos que aconteceriam depois. Assombroso.

Wilco de 1 a 13

No próximo domingo o Wilco retorna ao Brasil para a sua terceira passagem em solo nacional (a primeira vez que irei assistir). Uma oportunidade para resgatar a discografia deste grupo que conheci em 2004 e pouco depois se tornou uma obsessão pessoal. 1. AM (1995) O Wilco nasce das cinzas do Uncle Tupelo, aclamado grupo da cena country alternativa norte-americana. O nascimento foi meio traumático, já que o Uncle Tupelo acabou no momento em que Jay Farrar avisou que odiava Jeff Tweedy. Bem, os outros membros do Uncle Tupelo ficaram com Tweedy para formar o Wilco, então o problema devia ser Jay Farrar. O primeiro disco do Wilco segue caminhando exatamente no mesmo caminho onde estava o grupo anterior, um Country Rock moderno com um pouco de PowerPop setentista, bebendo na fonte do Flying Burrito Brothers. Há algumas boas músicas como I Must Be High , Box Full of Letters e Passenger Side , mas o resultado não impressionou nem público, nem crítica. Tivesse o Wilco se desintegrado após este...