Pular para o conteúdo principal

Texto antigo: Dossiê Iscariotes

Sexto semestre da faculdade, trabalhos intermináveis, pautas, roteiros, artigos, reportagens. E no meio disso tudo, as resenhas. E no meio de tantas resenhas uma era sofrível: O Dossiê Iscariotes de Marcos Losekann. Um pífio romance policial/sobrenatural com personagens fracos e uma história bizonha. Com insônia, fiz minha resenha mais verdadeira dos tempos de faculdade.

Todo romance policial tem uma estrutura parecida. Acontece um crime terrível e misterioso e ninguém sabe quem é o criminoso. Então alguém começa a investigar o caso. Junta as provas, observa todos os detalhes que o levarão até uma solução. Ele pode conseguir isso através de um simples telefonema ou através de um rosto refletido nas pupilas de uma mulher em uma fotografia.

Os livros desse gênero não são feitos para mudar a vida de ninguém, nem para provocar reflexões sobre a existência humana, ou a prática do jornalismo ou o que seja. Os aficionados por este gênero costumam a ler várias obras em pouco tempo, movidos pela adrenalina, pela dúvida em saber o final, em saber o desfecho de toda a trama, como em um filme de ação.

“O Dossiê Iscariotes” do jornalista Marcos Losekann é justamente um Romance Policial. É um livro diferente da maioria dos livros que os jornalistas costumam a escrever. Normalmente um jornalista escreve um livro para falar de seus feitos, ou escreve um livro-reportagem, uma biografia. Losekann não, ele escreve como um escritor apenas. Para escrever um Romance Policial, ele poderia ser um agricultor ou ter qualquer outra profissão. Mas, apesar disso, seu trabalho como jornalista influenciou a obra.

Porque ao invés de um detetive, policial ou agente secreto, o investigador da história é um jornalista. Anderlon Gonçalves Valderês, o AGV, uma espécie de 007 brasileiro, correspondente do jornal brasiliense “O Capital” em Manaus. No fim de 1988 no dia em que o seringueiro Chico Mendes é assassinado, acontece uma rebelião em uma prisão de Manaus. Na rebelião todos os presos são executados e uma freira que estava como refém, também.

Motivado por suas dúvidas e por seu instinto jornalístico ele vai se aprofundando nos fatos e descobre que a chacina na prisão foi uma queima de arquivos. Com interesse do governador que tinha ligação com o narcotráfico e da Igreja, já que a freira estava grávida de um padre. Já a história de Chico Mendes não tem influência na história. É apenas uma coincidência que leva AGV ao Acre e faz o leitor saber o ano em que a história se passa.

São duas tramas que desenvolvem a história. Uma em que AGV investiga as ligações entre a rebelião, o governo e a Igreja, e outra em que simultaneamente a investigação AGV tem visões da feira morta, recebe mensagens do além em sua secretária eletrônica.

Mas se a história é até interessante (notem uma tentativa de amenizar as críticas, já que a professora gostava do livro), os personagens não são. AGV é um jornalista perfeito. Escreve textos excelentes, tem as melhores técnicas de apuração, é ético, as redações de todo o Brasil falam dele, ele é incansável, recebe prêmios todos os anos e como se não bastasse isso, ainda tem um corpo com músculos definidos, faz sucesso com as mulheres e é resistente ao álcool. Único problema é que ele tem AIDS, é ateu e tem hemorróidas. E esses problemas acabarão.

Já os chefes de AGV são os canalhas completos. João e Rita são antiéticos, péssimos jornalistas, tentam derrubar seus colegas, são invejosos, conspiram e fazem sexo o tempo todo. Comemoram a demissão de AGV com sexo, a volta de uma viagem com sexo, e o fazem na cama, na sala e no carro. E como se não bastasse, João ainda é estéril. Enfim, não há identificação com os personagens.

A forma como a história se desenvolve lembra uma novela. AGV vai apurando os fatos, escapa da morte, se apaixona e quando está para revelar o caso, é demitido e vai para a miséria. Então a parte espiritual do livro ganha força. As aparições da feira se tornam mais freqüentes e ele acaba embarcando para Roraima, onde bebe com os índios, supera o HIV que já consome suas forças, escala um monte e encontra Deus. Ele foi o jornalista selecionado para entrevistar Deus, porque era o mais puro de todos.

Não se sabe o que ele conversou com Deus. Provavelmente estará nas continuações do livro, já que Losekann pensa em escrever uma trilogia.

O leitor pode observar então que faltam poucas páginas para o livro acabar, e pensa como é que AGV conseguirá ter, afinal, um final feliz. E então, como numa novela, tudo se resolve no último capítulo. Em poucas páginas o convertido AGV com Deus em seu coração volta a Manaus, perdoa todos aqueles que lhe fizeram mal, soluciona o caso com provas contundentes, descobre que seus chefes se arruinaram, recupera seu emprego onde vai trabalhar com sua namorada, tem sua matéria publicada, e ainda milagrosamente é curado da AIDS. Só faltou um casamento pra acabar.

Comentários

Postagens mais visitadas

Fuso Horário

Ela me perguntou sobre o fuso horário, se era diferente do local onde estávamos. Sim, informei que Mato Grosso está uma hora atrasado em relação ao Ceará. Perguntou se sentíamos alguma diferença, tive que falar que não. A pergunta sobre o fuso horário foi o suficiente para uma pequeno comentário sobre como lá no Ceará o sol se põe cedo e nasce cedo. Isso é exatamente ao contrário do Paraná, de onde ela veio, onde o sol se põe muito tarde. Ela demorou para se acostumar com isso. Não é nem seis da tarde e o sol se pôs. Não é nem seis da manhã e o sol já está gritando no topo do céu. Pensei por um instante que esse era um assunto de interesse dela. Que ela estava ali guiando turistas até um restaurante não facilmente acessível em Canoa Quebrada, mas o que ela gosta mesmo é do céu. Do movimento dos corpos, da translação e etc. Talvez ela pudesse pesquisar sobre o assunto, se tivesse o incentivo, ou se tivesse a oportunidade. Não sei. Talvez ela seja feliz na sua função atual. Talvez tenha ...

Os 50 maiores artilheiros do São Paulo no Século

(Até o dia 4 de fevereiro de 2024) 1) Luís Fabiano 212 gols 2) Rogério Ceni 112 gols 3) Luciano 87 gols 4) Jonathan Calleri 76 gols 5) França 69 gols 6) Dagoberto 61 gols 7) Borges 54 gols 8) Hernanes 53 gols 8) Lucas Moura 53 gols 10) Kaká 51 gols 11) Alexandre Pato 49 gols 12) Washington 45 gols 13) Reinaldo (Atacante 2001-2002) 41 gols 13) Grafite 41 gols 15) Danilo 39 gols 15) Diego Tardelli 39 gols 17) Souza 35 gols 18) Pablo 32 gols 18) Reinaldo (o lateral esquerdo) 32 gols 20) Hugo 30 gols 21) Brenner 27 gols 22) Gustavo Nery 26 gols 23) Alan Kardec 25 gols 24) Paulo Henrique Ganso 24 gols 25) Aloísio Chulapa 23 gols 26) Júlio Baptista 22 gols 26) Jorge Wagner 22 gols 26) Michel Bastos 22 gols 26) Aloísio Boi Bandido 21 gols 30) Cicinho 21 gols 30) Jadson 21 gols 30) Osvaldo 21 gols 33) Fábio Simplício 20 gols 33) Cícero 20 gols 33) Christian Cueva 20 gols 33) Robert Arboleda 20 gols 37) Thiago Ribeiro 19 gols 38) Amoroso 18 gols 39) Adriano Imperador 17 gols 39) Fernandinho 17 ...

Outras reações frustradas na Fórmula 1

No último domingo, certamente Lando Norris fez uma leve refeição antes de participar do Grande Prêmio do Brasil sonhando com uma virada que aumentaria suas chances de ser campeão do mundo. Poucas horas antes ele havia feito a pole position para a corrida, enquanto seu rival Max Verstappen largaria apenas na 17ª colocação.  Poderia sonhar com um vitória e com a possibilidade de seu rival chegar ali em uma distante quinta colocação. A distância de 44 pontos poderia cair para 29 e, aí, por mais que continuasse difícil ser campeão, não daria para negar que era uma chance. No entanto o que se viu no domingo foi completamente diferente. Contando com uma atuação primorosa e um pouco de sorte, Max Verstappen conseguiu a vitória em São Paulo. Lando, por outro lado viu tudo dar errado - largada ruim, fim do VSC na hora em que entrava no boxe, enfim, e chegou em oitavo. A reação virou um provável título de Verstappen na próxima corrida em Las Vegas - ainda acho mais provável o título na Sprin...